Comer a cada 3 horas? Não funciona. Evitar carboidratos à noite? Tanto faz. Dieta das proteínas? Bobagem. Quer emagrecer? Pergunte-se como. Achar sua resposta (e segui-la) é o mais importante
por Claudia Carmello
Não é difícil entender a mania de dieta: o mundo está engordando. Desde 1980, o número de obesos dobrou: hoje são 400 milhões no planeta. São 43% dos brasileiros acima do peso, e 1 em cada 4 estão ou estiveram recentemente de regime.
Na verdade, não há segredo para emagrecer. E também não há milagre: não vamos entregar uma fórmula de como secar em 5 semanas. Mas não vamos dizer que tudo é relativo: dá, sim, para saber como controlar o peso. A principal novidade é que discutir qual é a melhor dieta é bobagem. Para a maioria de nós, nenhuma delas funciona. Vire a página e entenda o porquê.
Na verdade, tanto faz se a dieta tem base de carboidratos, gorduras ou proteínas: o maior estudo sobre o assunto concluiu que todas se equivalem no emagrecimento a curto prazo e na recuperação do peso a longo prazo. Para a balança, o que interessa é quantas calorias o alimento tem.
Mito 2 - "Mulher engorda mais Fácil que homem"
Em média, sim. Mas isso não tem nada a ver com elas serem mulheres. Acontece que homens, por terem naturalmente um volume maior de ossos e músculos, tem o metabolismo mais acelerado. Ou seja: entre uma mulher musculosa e um homem flácido, quem engorda mais fácil é ele.
Mito 3 - "O estômago cresce com a barriga"
Só em obesos que comem quantidades colossais. Logo, é mito que para emagrecer é preciso comer menos até o estômago diminuir e "pedir" menos comida. O que engorda a maioria é beliscar itens de alta concentração energética e ir acumulando calorias extras.
Mito 4 - "Tomar suco natural ajuda no regime"
Não ajuda e pode atrapalhar. O problema dos líquidos que não sejam água (refrigerante, suco, cerveja etc.) é que suas calorias não são devidamente computadas pelo seu corpo. "Nosso organismo não tem a mesma capacidade de identificação de saciedade com líquidos e sólidos", diz Patrícia Jaime.
Mito 5 - "Carboidrato à noite engorda"
Não há fundamento científico que mostre isso. A crença seria de que comendo carboidrato à noite a pessoa armazenaria energia mais facilmente porque vai repousar e o metabolismo cai. Na verdade, o que vale é o balanço das calorias ingeridas e queimadas nas 24 horas anteriores.
Mito 6 - "Dormir pouco dá fome"
Em tese, a falta de sono diminuiria o nível do hormônio da saciedade (leptina) e aumentaria o da fome (grelina). Mas ainda há muito que se estudar, já que uma das consequências de estar acima do peso é ter sono ruim. Assim, não é dormir pouco que abre o apetite, mas o contrário.
Mito 7 - "Comer de 3 em 3 horas ajuda"
Ajuda a comer menos nas refeições. Mas daí a acelerar o metabolismo vai uma distância. Para a OMS, não há evidências de que fracionar as refeições diminua o risco de engordar. Ao contrário: o hábito faz com que você perca o controle nas refeições intermediárias.
Mito 8 - "Remédio pra emagrecer funciona"
Além de efeitos colaterais, como irritação, insônia, taquicardia, quando você para de tomar o remédio, o apetite aumenta. Outro caso são os remédios irresponsavelmente prescritos que causam disfunções na tireoide, glândula que regula o metabolismo.
Mito 9 - "Carboidrato não sacia"
"Não. Todos os alimentos dão saciedade", diz Mancini. Os carboidratos têm sido vilanizados porque se conclui que os do tipo simples (pão e arroz branco, batata, açúcar) desequilibram o organismo. Mas basta consumi-los com moderação.
A dieta no seu corpo
Cortar calorias de uma hora para outra é roubada: além de o organismo começar a poupá-las, fica preparado para engordar rapidamente assim que você caia em tentação.
A grande novidade no mundo das dietas não é nenhum regime revolucionário. É a publicação, no New England Journal of Medicine, dos resultados do maior experimento já feito na área, coordenado pela Faculdade de Saúde Pública de Harvard. Eles estudaram 811 pessoas com sobrepeso e as dividiram em grupos que, ao longo de dois anos, adotaram 4 dietas diferentes - todas eram balanceadas e saudáveis, mas diferiam nas porcentagens de proteína, carboidrato e gordura. Ao fim do programa, os seguidores dos 4 planos perderam a mesma média de peso: 4 quilos. Conclusão? Não importa o que você coma, o que emagrece é ingerir menos calorias. Aliás, dietas malucas podem até engordar.
A notícia é boa. Significa que não é preciso deixar de comer o que gosta, basta comer menos. O corpo pode até reagir diferente a diferentes nutrientes, mas a pesquisa confirmou que, na prática, o que pesa na balança é o que já tinha sido descoberto em 1850, com a 1ª lei da termodinâmica: colocando pra dentro menos energia (no caso, calorias) do que gasta, você emagrece; colocando mais, engorda; colocando igual, mantém o peso.
Como de costume, a má notícia vem junto: foram só 4 quilos perdidos em dois anos. No 1º semestre, os voluntários até emagreceram mais: 6 quilos na média. Mas aos poucos o autocontrole de calorias foi sendo relaxado e o peso foi recuperado. Você pode estar pensando que os gordinhos e gordinhas da pesquisa são uns frouxos e que com você é diferente. Mas a psicologia e a estatística garantem que não é.
Três décadas de estudos científicos sobre dietas ensinam uma lição pra lá de cética: a longo prazo, 9 em cada 10 pessoas que fazem regimes não conseguem manter o peso alcançado. Por quê? Parece fatalismo, mas seu corpo, sua mente e o ambiente ao redor colaboram para que você volte a comer mais e a engordar novamente.
O primeiro inimigo é seu próprio corpo, que age contra a dieta logo que os resultados aparecem. Quanto mais radical ela for, mais ele contra-ataca. A lógica: seu organismo não sabe a diferença entre a decisão de comer menos e fome involuntária. Para ele, se há uma constante perda de peso, sua vida está em risco. E trata de guardar energia.
Como você funciona
Para entender essa mobilização do organismo contra seu emagrecimento, é preciso entender como ele busca a energia para que você respire, caminhe, raciocine, mantenha o corpo a 37°C. Para ele, o que vale são os carboidratos, as gorduras e as proteínas.
O carboidrato é o principal combustível do corpo. Suas sobras são estocadas em pequena quantidade e transformadas em glicogênio. Como o glicogênio retém água, e isso ocupa espaço, é mais vantajoso para o corpo se livrar do carboidrato e armazenar outro nutriente: a gordura. Ela é armazenada desidratada, ou seja, tem mais calorias em menos espaço e, na prática, pode ser estocada sem limite. Eis o porquê de aquele pneuzinho crescer devagar, mas sempre. No espelho, uma derrota; na evolução, uma estratégia que garantiu a reprodução de vários genes. Já as proteínas são os tijolos do organismo: usadas para construir células, não estão livres para virar energia.
O que acontece se você passar a comer muito pouco? Vai gastar as calorias do alimento recém-consumido e, como não será suficiente para sobreviver, vai começar a gastar as reservas. Isso é emagrecer. O corpo usa primeiro o glicogênio, depois aproveita a gordura, e, se você continuar de boca fechada, pede um reforço extra para as proteínas, ou seja, seus músculos.
Durante a dieta, como o corpo recebe menos energia a cada dia, a reação não tarda. "É a reprogramação metabólica, a estratégia do organismo para sobreviver numa guerra", diz Patrícia Jaime, professora do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP. A lipase, enzima que regula o armazenamento de gordura, fica superativada. Também diminui o hormônio que nos deixa saciados (leptina) e aumenta o que nos dá fome (grelina). Lembre-se: seu corpo faz tudo para que você coma.
Moral da história: num regime bravo, a fome pisa no acelerador, a saciedade no freio e, mesmo com a restrição de calorias do início da dieta, o ritmo de emagrecimento estagna. Esse é o "platô da dieta", o ponto em que muita gente se frustra e volta à comilança, que vira gordura mais rápido do que antes (lipase superativada, lembra?). É o efeito sanfona, o sistema que faz você engordar mais a cada dieta frustrada.
Exceções à regra
Claro, para essa regra há invejadas exceções. Quem não conhece um cara que come até estourar e nunca engorda? É a hereditariedade. Genes da obesidade têm sido identificados pelos cientistas, e estudos com gêmeos mostraram que a genética contribui com seu peso entre 40 e 70%.
Há também a questão do exercício: para a OMS, há evidências convincentes de que eles não emagrecem. Mas, como hábito ao longo da vida, são ótimos para regular o peso. Não só pelo esforço mas pelo resultado: músculos consomem mais energia para se manter do que o tecido gorduroso. Ou seja: se você tiver um corpo sarado, vai gastar calorias mesmo que não estiver fazendo nada.
Você deve estar pensando: se há formas de interferir no metabolismo, então emagrecer de forma duradoura é possível. Sim. Só que a dieta - das proteínas, de South Beach, do que for - não é o caminho. A ideia de fazer um regime radical para secar e depois um mais leve para manter-se magro é uma armadilha. A maneira mais segura de emagrecer é devagar, reduzindo aos poucos a ingestão de calorias. Isso previne reações contrárias do organismo e dá tempo para adotar mudanças duradouras no estilo de vida.
Acredita-se que seja saudável perder de 5 a 10% do seu peso em 6 meses - para alguém de 60 quilos, no máximo 1 quilo por mês. Se ainda precisar emagrecer, deve primeiro manter esse peso por 6 meses, para depois investir em nova perda de peso. Como fazer isso? Aprendendo a comer menos e melhor, e tendo uma vida mais ativa. Como se viu no estudo de Harvard, a receita é simples. O que não significa que seja fácil.
A dieta na sua mente
Emagrecer seria simples se você não fosse um animal racional, cheio de vontades. Como não é o caso, arranje uma companhia de regime - duas cabeças emagrecem melhor do que uma.
Se a gente fosse máquina, era só programar: bastava ingerir as calorias necessárias às atividades do corpo e o peso seria mantido. Acontece que comer não é uma ingestão automática de nutrientes. Envolve fome, oportunidade, prazer, socialização, emoções e, claro, nossos hábitos.
Uma dieta que nos afaste totalmente da nossa rotina alimentar, por exemplo, tem pouca chance de ser mantida. "Sempre que você tem um cardápio com alimentos que não fazem parte do seu dia- a-dia, é claro que você vai largar a dieta", diz o endocrinologista Márcio Mancini, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. "O que funciona é a reeducação alimentar. Aprender a comer de um jeito que você seja capaz de manter sempre", diz Mancini.
Dieta dos Pontos (limita a quantidade de calorias atribuindo pontos para cada alimento, prevê ingestão de todos os grupos nutricionais, não proíbe nada e se adapta às preferências pessoais); a famosa Vigilantes do Peso (que também usa um sistema de pontos e tem como trunfo reuniões periódicas de orientação e motivação entre os participantes); a Dieta do Mediterrâneo (foca nas frutas, legumes, carnes brancas, azeite e castanhas, grãos integrais, consome poucos doces, carnes vermelhas e gordura saturada e traz grande benefício à saúde cardíaca).
Veja bem: ninguém disse que, porque a reeducação alimentar pode dar resultados bons a longo prazo, ela vai funcionar. Tudo vai depender da sua disposição para mudar hábitos, do meio social em que vive, de um acompanhamento médico e nutricional individualizado e de fatores emocionais.
Só se for a dois
Cada vez mais, pesquisadores dos fatores externos que influem na alimentação concluem que o sucesso de uma dieta depende de um fator fundamental: motivação. Aquele grande estudo de Harvard trouxe um resultado interessante nesse campo: os voluntários que compareceram a pelo menos dois terços das reuniões com médicos e outros voluntários emagreceram mais do que os que optaram por seguir no programa sozinhos: 9 quilos em dois anos, mais que o dobro da média. Frank Sacks, o líder do estudo e professor de prevenção de doenças cardiovasculares da Faculdade de Saúde Pública de Harvard, declarou à revista Time: "As pessoas precisam de apoio para manter a motivação e o foco".
Conclusão: conseguir um apoio ou um parceiro de dieta é muito mais importante do que escolher qual dieta você vai fazer. Novas pesquisas estão comparando diferentes tipos de acompanhamento em voluntários reuniões de grupo, interfaces online com médicos, orientação estendida ao resto da família - para saber qual é a melhor estratégia de suporte. Um estudo da Universidade de Yale já mostrou que casais que fazem dieta juntos tendem a perder mais peso do que homens e mulheres que não têm a colaboração do companheiro na empreitada.
Outro fator que pode contar contra é o "ambiente obesogênico", que empurra o indivíduo rumo aos quilos a mais. Claro, a gente engorda por comer demais e se mexer de menos, mas também porque temos uma oferta cada vez maior de comida à nossa disposição e uma vida mais sedentária. Comparando com a máquina: um carro não aumenta a ingestão de combustível se seus vizinhos de estacionamento estiverem consumindo mais que ele. Você sim. Isso sem falar em questões de autoestima, autoindulgência, autossabotagem. É como se um automóvel esvaziasse o posto ao ver modelos que fazem mais quilômetros por litro.
Justamente por se tratar de uma questão ambiental, a nova tendência das políticas públicas de combate à obesidade é abandonar o foco no indivíduo e criar ações coletivas. No norte da França, as cidades de Fleurbaix e Laventie provaram que funciona. Em 12 anos, com mais áreas públicas para esporte e orientação familiar, a obesidade entre crianças caiu a 8,8%, menos da metade da taxa de cidades vizinhas.
É proibido proibir
Emagrecer também consiste em se livrar de conceitos de certo e errado. "As dietas costumam se basear na noção de que alguns alimentos são bons e outros são ruins", diz Carol Munter, psicoterapeuta americana autora do best seller Overcoming Overeating ("Superando a Supercomilança", sem edição brasileira). Peguemos a dieta da sopa, por exemplo: todas as suas refeições serão um sopão de legumes. Ou a de Ornish: vegetariana e com apenas 10% das calorias vindas da gordura (no Brasil, consumimos em média 27% de gordura, e o limite para uma dieta balanceada seria de 30%). Ou mesmo a de Atkins, que manda dar adeus ao pedaço de pizza, ao prato de massa, aos pães, aos doces. Alguém consegue passar a vida num regime desses?
"Quando uma comida é proibida, torna-se especial e nós a queremos. Já quando ela é permitida, legalizada, podemos relaxar", completa. Bom, pode funcionar para várias pessoas, mas como confiar que uma população inteira de obesos vai conseguir aprender a ouvir sua fome e segui-la?
A ressalva não significa que a relação entre comer e sentir seja desprezada pela ciência. Pelo contrário. Já se sabe que alimentos altamente calóricos, especialmente doces, chocolates, injetam dopamina no sangue, um neurotransmissor que manda sinais de recompensa ao cérebro. E que o estresse aumenta os níveis dos hormônios que dão fome e dão o alerta para que a gordura abdominal comece a se acumular.
A ligação entre fome e emoção também tem sido provada por estudos neurológicos. Uma pesquisa publicada na revista Science em 2001, das Universidades Rockefeller, Princeton e da Califórnia, mostrou, através de mapeamento das regiões do cérebro de ratos que controlam a decisão da ingestão de comida, que a regulação de apetite responde a outros sinais além da leptina e da grelina, como os vindos de centros de emoção do cérebro - significa que você pode sentir ou deixar de ter fome independentemente do que comeu ou deixou de comer.
Ou seja, há muito mais entre a fome e a saciedade do que imagina o nosso vão nutricionismo. E tem gente lucrando com isso.
A dieta no seu mundo
A variedade de livros e produtos nas prateleiras se alimenta dos nossos desejos e falhas. E vem engordando: nos EUA, a indústria das dietas é maior que a de tênis
Você pode não prestar atenção no que come, mas há um setor inteiro da economia que analiza e dialoga com nosso constante desejo e eterna dificuldade de emagrecer. Não há estimativas do tamanho do mercado de dietas no Brasil, mas nos EUA, onde 67% da população está acima do peso, ele movimenta US$ 58 bilhões por ano - US$ 14 bilhões a mais que o mercado de calçados e só US$ 10 bilhões a menos que o gasto do governo americano com saúde.
O número leva em conta o faturamento de setores variados, como mercado editorial, refeições prontas e shakes, todo tipo de comidas e bebidas diet, light e zero, adoçantes, vídeos de fitness, sites de consultoria nutricional (afiliados ou não a uma dieta específica), remédios para emagrecer, spas.
Um passeio por qualquer livraria revela os milagres prometidos para todos os gostos, propósitos e crenças. Alguns títulos no Brasil são: Viva Melhor com a Dieta do Tipo Sanguíneo (seu tipo de sangue determina o que você vai comer), Emagreça Naturalmente com a Dieta da Lua (quando a lua muda, você só ingere líquidos por 24 horas), A Dieta do Abdome (programa de 6 semanas, foca em 11 alimentos que magicamente tiram gordura só da barriga), A Dieta da Zona Ayurvédica (baseada em princípios da medicina milenar indiana), A Dieta do Mel (duas colheres de mel antes de dormir queimam gordura). Se você prestou atenção até aqui, já sabe que é picaretagem.
A variedade de títulos vem no embalo dos best sellers do gênero. Os 7 livros do cardiologista americano Robert Atkins emplacaram, desde 1972, 30 milhões de cópias. A edição revisada do primeiro livro encabeçou a lista de mais vendidos do New York Times por 300 semanas seguidas entre 1999 e 2004. Já a série da Dieta de South Beach, lançada em 2003, vendeu 22 milhões de cópias. Uma piadinha do meio diz que a indústria da dieta anda em muito melhor forma que seus consumidores.
O fato é que nós também fazemos nossa parte nesse jogo de me-engana-que-eu-gosto. Trocamos o açúcar da caipirinha por adoçante para beber sem culpa um copão de pinga supercalórica. Pagamos a academia para não ir, mas sentir que já demos o primeiro passo. Seguimos as dietas das revistas porque preferimos comprar motivação a encarar um esforço consciente e de longo prazo. "É mais fácil entrar numa dieta com a esperança de que ela fará você se sentir melhor do que tentar entender a sua ansiedade", alerta Carol Munter.
Lógica aparente
Mas o que explica o sucesso da literatura de autoajuda nutricional? Fora alguns absurdos escancarados, o fato é que as dietas de sucesso vendem ideias que aparentemente fazem sentido. Aparentemente.
A Dieta de Atkins, por exemplo. Seu pulo-do-gato seria um processo chamado cetose, que ocorre quando o corpo não tem seu combustível preferido, a glicose, e é forçado a se manter basicamente convertendo as reservas de gordura em energia. De brinde, a cetose ainda libera cetonas, substâncias que tirariam o apetite. Mas estudos já mostraram que essa excreção de calorias pode ser muito baixa, cerca de 100 por dia. O fato é que a Dieta de Atkins costuma emagrecer rápido no começo porque boa parte do peso que se perde é músculo e água - sem falar que o cardápio é muito monótono. Outro equívoco de Atkins e seus derivados é dizer que carboidratos não dão saciedade, apenas gorduras e proteínas.
Outra confusão que virou lei é comer de 3 em 3 horas, o que manteria o organismo gastando energia. Ok, nutricionistas e endocrinologistas concedem: comer mais vezes pode ajudar a controlar a fome. Mas não acelera o metabolismo e, a longo prazo, dificilmente emagrece. Aliás, essa prática incentiva o consumo de snacks calóricos e as compulsões alimentares.
Outro problema são as dietas que liberam os líquidos. Sim, mesmo os sucos naturalíssimos, repletos de vitaminas. "Nosso organismo não tem a mesma capacidade de identificação de saciedade com líquidos e sólidos", diz Patrícia Jaime. Compare um suco de maçã e uma maçã, por exemplo. A maçã tem fibras (o que manda sinais de saciedade) e você a mastiga (o que manda sinais de saciedade também). No suco, as fibras foram perdidas, ao extrair o sumo da polpa você tem um concentrado de açúcar de várias maçãs (é mais calórico). Apesar das calorias, a bebida ainda vai deixar bastante espaço para a comida.
Nas prateleiras
A indústria alimentícia é outro ator central desse jogo. Para a OMS, há evidências de que o aumento da obesidade é influenciado pelo marketing agressivo das cadeias de fast food - lembra-se do ambiente obesogênico, contribuindo sutilmente para engordar?
Outros vilões são os alimentos de alta densidade energética. Normalmente industrializados, eles concentram muitas calorias em pouco volume e confundem nosso corpo, que vai engordando sem nos avisar para parar. Quem já mandou um pacote de biscoitos recheados para dentro sabe bem.
Por outro lado, as prateleiras são inundadas com opções que protegem contra aumento de peso. Como os alimentos adicionados de fibras e com selo de "baixo índice glicêmico" piscando no rótulo. Estamos exagerando no açúcar? Nos dão versão diet. Precisa-se de Omega-3? Compre margarinas enriquecidas dele. Muita gordura? Vá de livres de trans. É acender uma vela para Deus e outra para o Diabo.
Quer exemplos? Dois gigantes do mercado de refeições light, as multinacionais Jenny Craig e Slim-Fast (o carro-chefe são os shakes, também vendidos no Brasil), foram comprados pela Nestlé e pela Unilever (dona da marca Kibon), respectivamente. Já a multinacional Heinz, famosa pelas mostardas de grife, é também a dona do negócio de refeições prontas dos Vigilantes do Peso, cujos encontros semanais envolvem 1,5 milhão de pessoas e que faturaram perto de US$ 1,5 bilhão em 2007.
Por fraqueza sua ou astúcia dela, a indústria da dieta está aí, firme e forte, enquanto a gente está aqui, inseguro e guloso.
A dieta na sua vida
Emagrecer é simples e não é fácil. Mas não é impossível. Seus pneus só precisam de um empurrão firme para rodar
Insegurança e gula são boas palavras para começar a concluir esta conversa. Você já aprendeu que as dietas radicais não funcionam. E que imaginar o emagrecimento como um processo de duas etapas separadas - a perda de peso e a manutenção do peso - é autoengano. As duas são a mesma coisa: você precisa ter sucesso na decisão de comer menos e gastar mais calorias sempre. E, para que isso aconteça e dure, é preciso que você entre num processo constante e paulatino de mudança de hábitos alimentares e de atividade física, para emagrecer devagar.
Além disso, você pode melhorar sua saúde comendo alimentos variados, em porcentagens balanceadas - levando em conta que há carboidratos melhores do que outros (grãos integrais, frutas, legumes em vez de pão branco e doces) e gorduras melhores do que outras (azeites, castanhas, peixes em vez de carnes vermelhas e laticínios). Por fim, já sacou que ao longo de todo esse processo você vai precisar lidar com sua insegurança e gula diante das dificuldades emocionais, sociais e biológicas que, você já sabe, são parte da vida. Ah, também é preciso resistir aos ataques de ingenuidade diante da indústria para perder peso.
Após tantas respostas (algumas que talvez você já conhecesse), cabe uma pergunta: por que você quer emagrecer?
Cuidado com as expectativas. Não dá para virar a Fernanda Lima quando o espelho sempre mostrou uma silhueta de Preta Gil. Especialistas garantem que todo mundo pode emagrecer para ser mais saudável, mas nem todos conseguem ser magrinhos.
Perder peso e manter o resultado é um objetivo difícil e não tem receita de sucesso. É uma decisão de longo prazo e é você com você mesmo. Você com sua carga genética, seus vícios e seus prazeres.Vale a pena esquecer por um minuto a modelo perfeita do outdoor, os números desanimadores das pesquisas e olhar para a sua vida. Se está obeso ou com peso extra, tem hipertensão, se sente uma lesma, vá buscar aí dentro o que impede você de se motivar a mudar de vida. Se quer viver bem, é bom focar no seu bem-estar e se mexer, porque ninguém vai te pegá-lo pela mão. Agora, se você é parte dos 57% de brasileiros que têm um peso normal, mas passou a vida fazendo dieta em busca de um peso ideal, pense bem.
São 3 as alternativas. Você pode gastar o resto da vida entrando em dietas furadas, passando a sopinha toda semana pré-Réveillon e se sentindo loser depois do 1º de janeiro. É possível perder peso assim. Só não é possível virar magro. E cada vez vai se tornar mais difícil.
O segundo caminho é encarar o problema de frente, escolher um plano alimentar sensato, sem metas irreais. Dedicar tempo aos esportes, contar calorias, controlar a balança e - inevitável - rejeitar alguns convites para a churrascaria rodízio. Se essa é a sua escolha, que seja convicta. E consciente de que ter o corpo sarado (ou quase) vale mais do que (quase) qualquer feijoada.
A terceira opção é você descobrir que só vale fazer sacrifício se a questão for de saúde, que você quer continuar comendo o que gosta. Mesmo que isso não o deixe tão magro, você é capaz de aceitar esses pneuzinhos que nunca o largam, não fazem inveja a ninguém, mas que são seus. E, no conjunto, até que bem simpáticos.
AutoConhecimento
Nenhuma dieta vai para a frente se não forem consideradas as manhas, manias, desejos e limites de uma pessoa: você. Só sabendo e respeitando seus hábitos você vai encontrar uma dieta para chamar de sua.
Calendário
O jeito garantido para emagrecer é devagar e sempre - se correr, o corpo estranha; se parar, o peso volta. Faça planos de longo prazo, coisa de 1 kg por mês.
Companhia
Dieta boa é dieta acompanhada - seja por um especialista, um companheiro de corte de calorias e de exercícios, seja só por alguém que dê apoio. Um estudo de Harvard mostrou que quem faz regime com acompanhamento emagrece mais que o dobro do que quem tenta fazer sozinho.
Exercícios
Má notícia: provavelmente não vão fazer você emagrecer. Boa notícia: mantêm peso que é uma beleza.
Expectativa
Seja sincero com você mesmo: é fundamental não criar metas irreais. Você não vai ficar magro e sarado de uma hora para outra e, dependendo dos seus genes, é possível que nunca consiga.
Fome
Se a gente fosse máquina, ela viria só quando a gente precisasse de energia, mas há fatores externos na equação, que só agora começam a ser compreendidos.
Genética
Sim, tem quem coma um monte e não engorde. Ou quem faça dietas malucas - dessas que você acaba de ler que não funcionam -, e emagreça. Esses malditos são beneficiados por fatores genéticos pouco compreendidos e não reproduzíveis. Inveje e siga contando suas calorias.
Músculos
Valem quanto pesam. Depois de criado, só por existir, 1 kg de músculos consome cerca de 80 calorias por dia - ou dois chocolates Bis. Só para efeito de comparação, 1 kg de gordura queima 5 calorias diárias.
Platô
Existe um ponto chamado "platô da dieta", em que o corpo já sacou que vai faltar comida e começa a estocar gordura. É importante não desistir, pois o corpo está programado para engordar rapidamente.
Saciedade
Basicamente, é a sensação de matar a fome, provocada por um hormônio chamado leptina. Se você come rápido demais, não dá tempo de ela se manifestar, e alimentos de alta densidade calórica a deixam confusa. Preste atenção nela se quiser emagrecer.
Zíper
Fechá-lo é a maior recompensa de toda a dieta.
Para saber mais
Coma, Beba e Seja Saudável
Walter Willet, Campus, 2004.
Rethinking Thin
Gina Kolata, Farrar, Straus and Giroux, 2007.
Dieta do Mediterrâneo
Org. Rolf Zelmanowicz, Equipe ABC da Saúde, 2005.
www.who.int/topics/obesity/en/
Obesidade e Dieta segundo a Organização Mundial da Saúde.
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