O Brasil é o vice-campeão mundial em cirurgias bariátricas.
Um quarto dos pacientes que fazem cirurgia bariátrica reganha
peso e pode ter indicação para ser reoperado, aumentando os riscos de
complicações pós-cirúrgicas.
A principal delas é a fístula, o rompimento dos grampos usados na
redução do estômago. O risco passa de 1%, após a primeira cirurgia, para
13%, depois da segunda.
O Brasil é o vice-campeão mundial em cirurgias bariátricas, com cerca
de 80 mil procedimentos por ano (10% feitas no SUS), atrás apenas dos
EUA, com 140 mil.As reoperações para a redução de peso e as complicações
foram discutidas em congresso de cirurgia bariátrica que ocorreu na
semana passada no Rio de Janeiro.
Segundo os especialistas, é esperado ganhar até 10% do peso perdido
na cirurgia bariátrica. Por exemplo: se a pessoa perdeu 50 kg, é normal
que ela ganhe 5 kg.
O sinal vermelho acende quando o reganho de peso é maior, chegando a
50% ou mais. Pesquisa da UnB (Universidade de Brasília) com 80 pacientes
que tinham sido operados havia mais de dois anos mostrou que 23%
engordaram além do esperado.
Outro estudo da Universidade Federal de Alagoas com 64 obesos
operados revelou que, cinco anos após a bariátrica, 28% estavam obesos.
"O problema é que, além dos quilos a mais, o obeso volta a ter os
mesmos fatores de risco, como hipertensão e diabetes", diz o cirurgião
Almino Ramos, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e
Metabólica.
Segundo ele, a principal razão que leva ao reganho é a não aderência
do paciente a um novo estilo de vida, que inclui dieta equilibrada e
prática regular de exercícios.
"A cirurgia não faz milagre. O paciente precisa aderir a um programa
multidisciplinar, com nutricionista, psicóloga. Se ele não cumprir esse
acordo, o estômago vai dilatar e ele vai ganhar peso."
O Spa Med, em Sorocaba (SP), tem ao menos 150 pacientes nessas
condições: fizeram cirurgias de redução de peso e praticamente já
ganharam quase todo peso perdido. Alguns são reoperados.
"No começo, eles restringem [alimentos calóricos], mas depois vão
driblando as barreiras, tomam milkshake, comem chocolate, pipoca, bebem
e, quando se dão conta, estão obesos de novo", conta Lucas Tadeu Moura,
endocrinologista do spa.
Muitos desses pacientes, explica o médico, apresentam deficiência de
vitaminas, como a B12. A falta desse nutriente pode levar à anemia grave
e contribuir para danos cardíacos e neurológicos.
O empresário Antônio, 46, fez redução do estômago há quatro anos, com
195 kg. Hoje pesa 170 kg, tem diabetes e hipertensão. "Dieta e
exercício não funcionam comigo."
Outro estudo apresentado no congresso do Rio mostrou que 80% dos
obesos à espera da cirurgia bariátrica em um serviço de saúde tinham
transtornos psiquiátricos (de humor e de ansiedade).
"Isso tem que ser tratado antes da cirurgia. Não adianta colocar a carroça na frente dos bois", diz Ramos.
Segundo Lucas Moura, é frequente também o paciente trocar a comida pela bebida, tornando-se alcoólatra.
"É complicado. Ele faz a cirurgia, acha que está curado e some do radar do médico."
VICIO
Obeso desde sempre. É como o engenheiro João, 56, se autodefine. "Fui
um bebê Johnson, cheio de dobrinhas. Na infância e na adolescência,
sempre fui gordinho."
Na década de 1980, João atingiu 250 kg e decidiu ir morar em um spa.
Após um ano de restrições alimentares e exercícios físicos diários,
chegou aos 90 kg. "Foi a melhor época da minha vida."
Mas, aos poucos, foi ganhando peso de novo até bater nos 200 kg. "Já
viu, né? Família de italianos, tudo gira em torno de comida. Brincando,
eu comia duas, três pizzas", conta. O pai e os irmãos também são obesos.
Na década de 1990, João fez duas cirurgias bariátricas. Em ambas
ocasiões, conseguiu chegar aos 130 kg. Hoje está com quase 200 kg e não
pretende fazer uma nova cirurgia por contas dos riscos de um terceiro
procedimento.
"Obeso é como alcoólatra, não pode chegar perto de comida. A gente
opera, mas a cabeça continua igual. Eu sei que me alimento de forma
errada, como muito pão e massa. Deveria levar a reeducação alimentar a
sério, mas não consigo."
Ele também diz ter dificuldades em praticar exercícios físicos em
razão do inchaço nas pernas, provocado por uma infecção de pele grave.
Apresenta ainda deficit de vitamina B12, ferro e cálcio, o que o fez
perder os dentes. "Minha pele está seca, as unhas descamadas. Além de
não emagrecer, fiquei com muitas sequelas. Comigo não deu certo", relata
o engenheiro, que mantém acompanhamento psiquiátrico.
Fonte: Folha de São Paulo
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