Mas a verdade é que as gorduras têm um papel fundamental nas nossas vidas.
por Gonzalo Navarrete
De tão ostensivamente associadas aos efeitos negativos, elas são temidas por quem pretende ter uma alimentação saudável. Mas a verdade é que as gorduras têm um papel fundamental nas nossas vidas. Se isso não bastasse, elas são excelentes condutoras de sabor e meios fantásticos de cocção – atire a primeira pedra quem não gosta de uma fritura bem-feita!
O que são gorduras?
Vamos voltar no tempo e relembrar um pouco as aulas de química do ensino médio. Gorduras, conhecidas também como lipídeos, são substâncias químicas formadas basicamente por ácidos graxos e glicerol (a proporção é de três moléculas de ácidos graxos ligadas a um glicerol). Elas podem ser encontradas na natureza sob a forma sólida (
gordura) ou líquida (óleos). Mas por que elas acabaram ocupando um papel tão importante na nossa alimentação? Basicamente porque são essenciais para o nosso organismo. Em primeiro lugar, é uma importante fonte de energia, altamente concentrada. São nove calorias por grama, mais que o dobro da quantidade de energia existente nos carboidratos e proteínas (4 cal/g), as outras substâncias básicas que compõem a nossa alimentação. Também fornecem vitaminas (A, D, E e K), revestem e protegem órgãos vitais. A digestão das gorduras é mais lenta, o que garante uma sensação de saciedade e um intervalo maior entre as refeições.
Os ácidos graxos são formados por cadeias de carbono (18 ou mais átomos). Alguns desses átomos de carbono se ligam a um par de átomos de hidrogênio, formando o grupo CH2. O grau de saturação da
gordura está diretamente ligado ao número de pares de hidrogênio existentes – quanto mais ligações, mais saturada a
gordura. As chamadas gorduras saturadas são encontradas em estado sólido na temperatura ambiente, geralmente na
gordura animal, como carne, banha e derivados do leite.
A manteiga, derivada do leite, é rica em
gordura saturada, sólida
É verdade que óleo de oliva faz bem para a saúde?
S im. O óleo de oliva é rico em
gordura monoinsaturada, mais que qualquer outro óleo vegetal. Uma
gordura monoinsaturada é aquela em que falta só um par de átomos de hidrogênio na cadeia carbônica do seu ácido graxo – por decorrência, poliinsaturada é aquela em que faltam dois ou mais pares. Na sua composição, o óleo de oliva tem 77% de
gordura monoinsaturada. No óleo de canola, a porcentagem é de 62% e no de amendoim, 49%. A sua principal característica é manter o nível do bom
colesterol no sangue, que, por sua vez, retira de circulação o mau
colesterol. Cientificamente, já ficou provado que as gorduras monoinsaturadas ajudam a reduzir o risco de doenças cardiovasculares, como infarto do miocárdio e problemas coronarianos. A oliveira é originária da região banhada pelo Mar Mediterrâneo e seu óleo já era consumido na antigüidade pelos povos que habitavam essa área – gregos, hebreus, etruscos.
O azeite extravirgem, considerado o mais nobre de todos, é obtido da prensagem mecânica das azeitonas, com acidez máxima de 1%. Há ainda o azeite virgem, feito também por métodos mecânicos, com até 2% de acidez, e o azeite refinado, que são azeites virgens de qualidade inferior tratados quimicamente. O que se chama simplesmente de azeite de oliva é uma mistura de azeites virgens e refinados. O azeite é muito usado para temperar pratos, dado o seu aroma e sabor extremamente agradáveis, mas também pode fritar. Se for usado para esse fim, ele tem um problema: queima a temperaturas mais baixas que outros óleos vegetais. Outro problema do azeite é o preço elevado, que faz mal ao bolso.
O azeite de oliva é um dos pilares da chamada dieta mediterrânea, considerada muito saudável
O que é ranço?
Uma
gordura rançosa é aquela que teve sua estrutura química degenerada por um destes fatores: água, sal, ar, temperatura ou resíduos de frituras anteriores. O gosto característico do ranço pode ser sentido em qualquer alimento rico em lipídeos, como nozes ou queijos. No caso dos óleos, o mau cheiro, a cor escura e a alteração da viscosidade podem ser encarados como um alerta de que ele entrou em decomposição. Geralmente isso ocorre quando o óleo ultrapassa a sua temperatura máxima de 200ºC. Ele começa a queimar e libera compostos acres e uma fumaça picante. Além da temperatura, o ranço também pode ser causado por outros dois tipos de reações químicas, que resultam principalmente da reutilização excessiva do óleo. A primeira reação é a hidrólise, que ocorre na hora do contato da água dos alimentos com o óleo. Quimicamente, a
gordura libera ácidos graxos e glicerina, aumentando a acidez e desprendendo um odor desagradável.
É por isso que não se recomenda tampar a frigideira durante o processo de fritura. A fumaça quente na superfície fria da tampa forma gotas d’água, que caem no óleo. Esse processo acelera a deterioração do óleo. Já a oxidação ocorre pela reação das enzimas da
gordura com metais ou com o próprio ar. Para aumentar a vida útil do óleo, é preciso filtrá-lo e mantê-lo em ambiente fechado e escuro o que evita a oxidação da substância, segundo a nutricionista Viviane Lourenço Braz, especialista em frituras. E
Por que algumas frituras são sequinhas e outras, encharcadas?
Porque as frituras encharcadas não foram bem-feitas. Para fazer uma boa fritura, o óleo deve estar bem quente (cerca de 180ºC) e os alimentos, preferencialmente secos. Isso impede que a água, ao entrar em contato com alta temperatura, evapore rapidamente e espirre óleo. Ajuda muito se o alimento estiver picado miúdo e completamente mergulhado no óleo. Quando a peça é muito grande, ela irá provocar uma queda na temperatura do óleo. A crosta vai demorar mais tempo para se formar e o alimento vai ficar encharcado de óleo por causa da demora no cozimento. O óleo novo, por incrível que pareça, não é a melhor alternativa para a fritura. O ideal é acrescentar duas colheres (sopa) de óleo usado. Dessa forma, a reação entre o óleo e a água dos alimentos não será tão brusca – o óleo velho tem substâncias residuais que propiciam um certo grau de mistura entre água e
gordura. Há alimentos que parecem predestinados ao processo de fritura – o caso mais clássico é o das batatas.
Elas têm os açúcares e o amido que se transformam em uma casquinha dourada rapidamente. Como regra geral, para nossa saúde, é sempre melhor fritar em
gordura vegetal (insaturada), do que na animal. Em termos de paladar, frituras em
gordura animal são mais saborosas. Os belgas têm a fama de fazerem a melhor batata frita do mundo. O segredo? Banha de cavalo.
Por ser rica em amido, a batata é um alimento ideal para frituras
O
colesterol é uma
gordura produzida pelo organismo humano e de outros animais – não existe
colesterol vegetal. Ao consumir uma quantidade excessiva de gorduras saturadas (encontradas em frituras, hambúrgueres e salgadinhos), a produção de
colesterol aumenta. Como toda
gordura, o
colesterol não se dissolve na água e não pode se deslocar sozinho pelo sangue. Ele é encapado por proteínas e se transporta na forma de lipoproteínas. Quando produzidas em grande número, as lipoproteínas ficam depositadas nas artérias e provocam o seu entupimento, aumentando o risco de acidentes cardiovasculares.
Por que algumas frituras precisam ser passadas na farinha?
O caso do bife à milanesa (que usa farinha de rosca) e da lula à doré (com farinha de trigo). Os mais apressados diriam que é apenas uma questão estética, para formar uma casquinha marrom. Na verdade, os alimentos podem ser empanados por duas razões. A mais simples é também a mais óbvia: proteger a integridade dos alimentos (como os peixes, que se despedaçam facilmente). A farinha de rosca ou trigo, que adere ao alimento com a ajuda dos ovos, também é usada para produzir “artificialmente” a característica crocante em alimentos como a carne – que não tem nem açúcar nem amido para produzir uma crosta externa. A grande desvantagem dos alimentos fritos com farinha é que eles absorvem muito mais
gordura que a maioria das frituras comuns.
A produção mundial de óleos líquidos é maior que a de
gordura sólida. Só que a indústria usa mais
gordura sólida – em bolachas, manteiga, bolos. A saída foi solidificar o óleo com a adição de hidrogênio, que satura artificialmente a
gordura, deixando sua estrutura molecular mais estável. É o caso da margarina e da banha vegetal, tão prejudiciais à saúde quanto a
gordura animal.
A capa de farinha faz com que carnes fritas tenham uma casquinha crocante.
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