Jakeline Maurício Bezerra de SouzaI; Mariana Mendonça de CastroII; Eulália Maria Chaves MaiaIII; Ana Nunes RibeiroDIV; Katie Moraes de AlmondesV; Neuciane Gomes da SilvaVI
I Psicóloga e Estudante de graduação em Licenciatura (Psicologia) pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte
II Estudante de graduação em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte
III
Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo e
Mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul
IV Mestre em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco e Especialista em Bioquímica da Nutrição
V Mestre em Psicobiologia pela Universidade do Rio Grande do Norte
VI
Doutora em Biologia do Comportamento pela Universidade de Paris XIII
e Mestrado em Psicologia pela Universidade de São Paulo
Apoio Financeiro: CNPq-PIBI
RESUMO
A
obesidade é considerada pela Organização Mundial de Saúde como um
dos mais graves problemas de saúde pública do mundo. O objetivo desta
pesquisa consiste em identificar aspectos comportamentais e sociais
envolvidos na dificuldade em perder peso e mantê-lo a longo prazo,
após tratamento nutricional para perda de peso. A amostra foi
composta de pacientes que buscaram tratamento nutricional no Hospital
Universitário Onofre Lopes, e seus familiares. A coleta de dados
ocorreu através de questionários e em dois momentos: no início e após
6 meses de tratamento. Foram entrevistadas 10 pessoas: 5 mulheres,
com idade entre 25-57 anos, e um dos seus familiares, totalizando
também 5. No início do tratamento identificou-se que as pacientes
possuíam um padrão de comportamento alimentar incorreto e
desorganizado, como por exemplo, deixar de realizar alguma refeição.
Um dos aspectos mais importantes como desencadeadores da vontade de
comer, refere-se aos fatores emocionais e situacionais: ansiedade,
angústia, preocupação, solidão, tensão/estresse, raiva e tristeza.
Após 6 meses de tratamento, os resultados demonstram que as pacientes
fizeram algumas modificações em seu comportamento alimentar, porém,
estas modificações não foram suficientes para garantir bons
resultados: apenas 2, conseguiram perder peso. O apoio social foi
identificado como uma variável importante. As pacientes que o
recebem, relatam bem estar e motivação, as que não, frustração.
Quanto aos familiares, estes percebem que a obesidade é prejudicial à
saúde, sendo assim importante fazer dieta. Afirmam que podem ajudar
no tratamento, no entanto não sabem como fazê-lo. Provavelmente uma
intervenção que contasse com a participação dos familiares produzisse
melhores resultados.
Palavras-chave: Obesidade, Tratamento, Apoio familiar.
Introdução
A
obesidade é um dos mais sérios problemas de saúde mundial. Doença
epidêmica, crônica, multifatorial, dispendiosa, de alto risco e que
afeta milhões de pessoas, sem respeitar fronteiras, idade, sexo,
raça, condição financeira. O aumento de sua incidência e prevalência é
uma das maiores preocupações dos profissionais e pesquisadores da
área de saúde (Ades & Kerbauy, 2002; Porto, Brito, Calfa,
Villela, & Araújo, 2002). No Brasil, mais especificamente nas
regiões Nordeste e Sudeste, aponta-se, em adultos, uma prevalência de
obesidade de 6,7% e 30% de sobrepeso (Abrantes, Lamounier &
Colosimo,2003).
O
aumento da incidência e prevalência deve-se principalmente ao estilo
de vida, consumo de alimentos ricos em gorduras e açúcares,
sedentarismo, redução de consumo de fibras. (Anderson & Wadden,
2000; Duchesne, 2001; Pinheiro, Freitas & Corso, 2004). Nossa
cultura capitalista e, sobretudo consumista, dispõe de estímulos que
desencadeiam a ingestão excessiva de alimentos supérfluos, como,
sanduíches, refrigerantes, chocolates, biscoitos e salgadinhos. Nos
relacionamentos sociais não é diferente, é comum agraciar visitas com
jantares, lanches (Mezomo, 1994; Stuart, 1999). Felicidade ou
tristeza é motivo para comer. Sem dúvida, o fácil acesso a comidas
saborosas, com alto teor de gordura e a redução ou a inexistência da
atividade física são fatores que facilitam a acumulação de peso.
A
obesidade pode ser conceituada como um aumento de massa de gordura
no corpo, em forma de triglicérides, devido a um balanço energético
positivo ou, ainda como conseqüência do abuso de alimentos sem
propósito nutricional. Assim, o corpo fica com um excesso de peso que
difere dos padrões médios para altura, idade e sexo. (Gayoso,
Fonseca, Spina & Eksterman, 1999). Atualmente, o diagnóstico da
obesidade é feito através do cálculo do Índice de Massa Corpórea
(IMC). Obtido pela fórmula: peso dividido pela altura ao quadrado. O
IMC é uma medida que relaciona peso e altura, tendo excelente
correlação com a quantidade de gordura corporal e sendo largamente
usado em estudos epidemiológicos e clínicos. É um método simples,
reprodutível e com significativo valor diagnóstico e prognóstico.
Considera-se que um IMC entre 25,0 e 29,9 significa sobrepeso, entre
30,0 – 39,9 é obesidade e IMC acima de 40 demonstra obesidade
mórbida.
De
acordo com Ades e Kerbauy (2002) a “obesidade é uma condição
complexa, de origem fisiológica, psicológica, social e situacional”
(pág. 3). Pinheiro et al. (2004) apontam a obesidade enquanto uma
doença multifatorial e destacam, também, a influência de fatores
ambientais e genéticos em sua gênese.
Gayoso
et al. (1999) definem a obesidade como “uma doença
endócrino-metabólica crônica heterogênea, com base genética,
poligênica na sua maioria, desencadeada por fatores ambientais,
principalmente superalimentação e sedentarismo” (pág. 30). Destacam,
ainda, que a obesidade refere-se a uma norma de peso acima da qual o
indivíduo passa a sofrer conseqüências somáticas, psicológicas e
sociais.
É
comprovado que o excesso de peso associa-se ao aparecimento de
diversas complicações, incluindo as cardiovasculares, como hipertensão
arterial, insuficiência coronariana, arteriosclerose; osteomusculares;
respiratórias; dermatológicas; distúrbios endócrino-metabólicos, como a
diabetes e a dislipidemia; e neoplásicas (Francischi et al. 2000; Must
et al. 2000; Yanovski & Yanovski, 2000).
Vale
salientar, ainda, os prejuízos sociais e econômicos associados à
morbidade e à mortalidade precoce da obesidade. A imagem negativa
despertada por obesos, sendo responsabilizados pelo seu problema,
provoca sofrimento e sérias dificuldades no âmbito social e
ocupacional, incapacitação física, absenteísmo, aumento de licenças
médicas, perda e/ou recusa de emprego, queda de renda, depressão,
ansiedade, baixa auto-estima, isolamento social; enfim a obesidade
provoca grandes prejuízos na qualidade de vida dos indivíduos e pode
alterar a longevidade (Gayoso et al. 1999; Heller & Kerbauy, 2000).
É reconhecido que a obesidade está além da força de vontade, preguiça e
da falta de caráter.
O
emagrecimento ao peso ideal sempre foi o objetivo do tratamento da
obesidade. Tal objetivo, alvo de questionamentos, sofre há alguns anos
modificações. Atualmente aponta-se que uma redução de 5% a 25% do peso
corporal inicial traz benefícios significativos (Anderson & Wadden,
2000; Francischi et al. 2000).
A
obesidade tem sido alvo de inúmeros estudos, no entanto, seu
tratamento não tem tido os resultados esperados e desejados devido, em
grande parte, ao manejo inadequado das estratégias e recursos
disponíveis (Gayoso et al. 1999). Segundo Ades e Kerbauy (2002), a
manutenção dos resultados dos programas de redução da obesidade é uma
questão a ser esclarecida apesar dos resultados positivos e bem estar
conseqüente das pessoas que passam pelo mesmo. Já Anderson e Wadden
(2000) afirmam que, independentemente da necessidade real de emagrecer,
pacientes e médicos ficam desapontados com os resultados da terapia
para redução do peso. O tratamento constitui-se, pois, um grande
desafio, freqüentemente associado à frustração de profissionais e
pacientes (Gayoso et al. 1999).
Stuart
(1999), defende que a família tem um papel importante, seja para
manter a superalimentação e inatividade, seja para desenvolver melhores
padrões de alimentação e atividade. Afirma, ainda, que a família
poderá ajudar o paciente através de ações que sirvam de exemplo para
que este torne seus hábitos alimentares saudáveis. Assim, não basta que
o familiar dê conselhos ao obeso sobre o que é certo, mas que ele se
envolva também no tratamento, procurando, por exemplo, acompanhar o
obeso em caminhadas ou modificando, também. os seus hábitos
alimentares. Neste sentido, a família representaria uma fonte de apoio
social que promove mudanças.
O
apoio social é definido como qualquer informação e/ou auxílio
material, oferecido por grupos e/ou pessoas que relacionam e que
provocam efeitos emocionais e/ou comportamentos positivos (Valla,
1999). Andrade (2001), define o apoio social como um processo de
interação entre pessoas ou grupos, que através do contato sistemático
estabelece vínculos de amizade e de informação, recebendo apoio
material, emocional, afetivo, contribuindo para o bem estar recíproco e
construindo fatores positivos na prevenção e na manutenção da saúde.
Spiegel (1997, citado por Andrade, 2001) defende que o apoio social
provoca conseqüências físicas, influenciando o comportamento das
pessoas, ajuda a evitar maus hábitos e comportamentos de risco, que
podem alterar os sistemas imunológico, nervoso e cardiovascular. O
apoio social destaca o papel ativo que os indivíduos podem desempenhar
na resolução dos seus problemas.
O
objetivo deste estudo foi identificar variáveis comportamentais
envolvidas na dificuldade em perder peso e mantê-lo a longo prazo,
considerando o apoio social como um fator importante para as pessoas
de um modo geral. O intuito deste trabalho foi investigar também, se o
apoio familiar é uma variável importante para as pessoas que se
submetem ao tratamento da obesidade. Este estudo tem um caráter
inovador, pois de acordo com os nossos conhecimentos, o apoio
familiar em relação ao tratamento da obesidade não tem sido objeto de
investigações.
Metodologia
Realizou-se
um estudo longitudinal, no qual a amostra a ser avaliada foi escolhida
entre pessoas que buscavam tratamento nutricional no ambulatório do
Hospital Universitário Onofre Lopes, residentes na zona urbana do
município de Natal, Rio Grande do Norte. A coleta de dados foi
realizada entre maio e novembro de 2004.
A
amostra está composta de cinco sujeitos, todos contatados durante a
primeira consulta ambulatorial com a nutricionista. Os instrumentos
foram aplicados individualmente, em um consultório do ambulatório do
Hospital Universitário Onofre Lopes em condições ambientais adequadas. A
nutricionista encaminhava os sujeitos que obedecessem aos seguintes
critérios: não apresentar diabetes e/ou hipertensão; não estar
ingerindo anorexígenos, sem suspeita de gravidez; idade variando de 25 a
50 anos; não estar em tratamento psicológico. Quando o participante
satisfazia os critérios, o experimentador explicava-lhe sobre o
procedimento da pesquisa. A amostra era esclarecida, também, quanto aos
objetivos, o sigilo dos dados, os benefícios e as visitas
domiciliares. Aceitando participar da pesquisa, os sujeitos assinavam
um Termo de Consentimento como participante voluntário e logo em
seguida, respondiam ao questionário.
Um
familiar responsável pela alimentação do paciente, ou um outro
familiar no caso em que paciente e responsável pela alimentação eram a
mesma pessoa, também foi entrevistado no mesmo período. Foram
entrevistados cinco familiares. Entre estes estão: três esposos, um
filho, um irmão. O contato com o familiar foi feito por telefone. Neste
primeiro contato, era esclarecido sobre a pesquisa, caso aceitasse
participar, marcava-se uma visita na sua residência, onde seria feita a
entrevista individual.
Foram
utilizados os seguintes instrumentos: um questionário semi-aberto,
aplicado no início do tratamento; um questionário semi-aberto de
avaliação, aplicado após 6 meses do primeiro; e uma entrevista
estruturada, utilizada com os familiares, no início do tratamento e
após 6 meses. Vale salientar que os instrumentos foram elaborados pelos
autores desta pesquisa, com base na literatura.
No
primeiro instrumento utilizado com os sujeitos foram investigadas as
seguintes variáveis: sexo; situação conjugal; paridade; renda
familiar, escolaridade, trabalho remunerado; atividade física; número
de refeições diárias; local das refeições; existência de horários
definidos para a alimentação; realização de outra atividade enquanto
se alimenta; quantidade de horas/dia que assiste à televisão;
situações em que pensa em comida; freqüência com que se preocupa com o
peso; repetição das refeições; alimentação ocorre rápido ou devagar;
existência de mais pessoas na família com excesso de peso; início
dos problemas com peso; consumo de açúcar, massas e gorduras;
situações que desencadeiam a vontade de comer; motivo que levou a
ganhar peso; estresse; a índice de massa corporal (IMC). No
questionário de avaliação, as variáveis descritas anteriormente
permaneceram para possibilitar comparação entre os dados. Além disso,
foram acrescentados, à investigação, outros dados como: ocorrência
de perda de peso, obediência à dieta; fatores que dificultam e
facilitam a perda de peso; situações em que se alimentam; sentimentos
com relação ao fracasso ou sucesso do tratamento; apoio social;
permanência no tratamento; satisfação com os resultados do
tratamento; motivação para perder peso e sugestões para melhorar os
resultados. Já com os familiares investigou-se dados tais como: local
das refeições; responsável pela escolha e preparação das refeições;
importância de perder peso; como estão ajudando e como poderiam
ajudar os pacientes na perda de peso, etc.
Resultados
Foram
estudados cinco sujeitos de sexo feminino, casadas, com idade variando
de 28 a 50 anos. A média da idade foi de 36,4 anos. Com relação à
escolaridade, três possuem até o ensino fundamental; uma, até o
ensino médio e uma, superior. Uma participante possui renda familiar
até 1 salário mínimo, três possuem, até 2 salários e uma renda de até
8 salários. A média da renda mensal foi de 3 salários. O IMC variou
entre 29,3 a 57,8 kg/m², com média de 40,2 kg/m².
Os
dados coletados apontam que quatro dos sujeitos fazem três refeições
por dia, não possuem horários definidos para sua realização, deixam de
realizar alguma refeição e o período que sentem mais vontade de comer é
à tarde. Todas afirmam que nunca acordam durante a noite para
alimentar-se.
A
maioria das pacientes (quatro) afirma que faz outra atividade enquanto
come, sendo a mais citada, quando à assistir televisão. Além disso,
duas revelaram que permanecem assistindo à televisão por até 2 horas e
três, 2-3 horas por dia. Quanto ao lugar que come habitualmente, duas
referem-se à sala, duas, ao quarto e apenas uma, à cozinha. Sala e
quarto são muito provavelmente os locais onde se encontra a televisão.
Em
relação ao pensar em comida, três pacientes pensam às vezes e duas
constantemente. Este pensar na comida ocorre principalmente quando
estão com fome (duas) e no horário das refeições (duas). Quatro
participantes afirmam que se preocupam com o peso constantemente.
Com
referência aos hábitos alimentares, quatro pacientes afirmam que comem
rápido e repetem as refeições freqüentemente. Três, alimentam-se sem
companhia e duas são as primeiras a terminar as refeições. Três afirmam
que não realizam lanches; as demais o fazem. Com relação à freqüência
de ingestão de doces, três afirmam que ingerem às vezes e duas, todos
os dias. Duas dizem que ingerem massas todos os dias e ingerem gorduras
e/ou frituras quase todos os dias. Quatro pacientes reconhecem que sua
vontade de comer é aumentada em relação às outras pessoas e uma não
soube responder a esta pergunta. Todas as pacientes se envolvem na
escolha e/ou preparação da alimentação.
Aspectos
genéticos e familiares são apontados por quatro pacientes que
revelaram ter em casa outra pessoa com excesso de peso (três filhos e
um cônjuge). A infância, a adolescência, o casamento e a gravidez foram
relacionados, pela amostra, ao início da obesidade. O casamento foi
citado por três pacientes como fator que as fizeram engordar, duas
referiram-se ao excesso de comida e uma referiu-se à ansiedade e ao uso
de anticoncepcional.
No
tocante à atividade física, quatro praticam caminhadas e começaram as
atividades físicas concomitantes ao tratamento. O total da amostra
(cinco) reconhece que sua vida é estressada todos os dias e apenas três
fazem alguma atividade (trabalhos manuais, reza, ouve música, lê) para
diminuir este estresse.
Todas
as pacientes referiram-se a sentimentos e/ou situações tais como:
ansiedade, angústia, frustração, tédio, solidão, tensão/estresse, raiva
e tristeza; como desencadeadores da vontade de comer.
A
seguir serão descritos os resultados obtidos com o questionário de
avaliação, aplicado com o objetivo de verificar a ocorrência de
possíveis mudanças no intervalo de seis meses após o início do
tratamento.
A
maioria das pacientes (quatro) afirma que recebem algum tipo de apoio
na sua tentativa de perder peso e sentem-se bem e fortalecidas em
função desse apoio. Por outro lado, quem não recebe (uma) apoio,
sente-se impotente. As pacientes revelaram ainda que, a dieta, o desejo
de ficar bonita, o medo de morrer e a força de vontade são fatores que
têm incentivado a perder peso. Três pacientes permaneceram em
tratamento com a nutricionista e estão satisfeitas com os resultados do
tratamento, pois já percebem os benefícios. Duas participantes apontam
dificuldades financeiras para manter a dieta, como um fator que tem
dificultado sua tentativa de emagrecer. As demais se referiram a
ansiedade (uma), ao trabalho (uma) e a falta de vontade/acomodação
(uma). Com relação à motivação para procurar tratamento, duas
referem-se às conseqüências da obesidade, uma a encaminhamento médico,
uma ao desejo de emagrecer e uma a problemas conjugais. Quando
questionadas sobre como podem melhorar os resultados do tratamento duas
afirmaram que é necessário obedecer corretamente ao tratamento e fazer
atividade física; uma respondeu que se deve diminuir a ansiedade; uma,
diminuir a quantidade de alimentos ingeridos e outra, que é necessário
ter condições financeiras de manter a dieta.
A
maioria das pacientes (três) passou a fazer mais de 3 refeições por
dia e estão definindo horários para realizá-las. Todas se referem ao
horário vespertino como o período que sentem mais vontade de comer.
Três participantes permanecem efetuando outra atividade enquanto comem,
sendo a principal assistir à televisão. Três, afirmam que passaram a
se alimentar acompanhadas, não repetem as refeições e estão fazendo
lanches durante o dia (sucos, chá e frutas) e admitem que não obedecem
rigorosamente à dieta. Metade da amostra (três) come quando se sente
atraída pela comida; uma, quando está com fome e outra, come em
horários regulares. Três pacientes modificaram a velocidade da
alimentação, estão comendo mais devagar; as demais não alteraram este
comportamento.
Com
relação aos resultados do tratamento, apenas duas pacientes
conseguiram perder peso, uma perdeu 6 kg e outra, 3,5 kg. As outras
três que não conseguiram perder peso atribuem aos seguintes fatores:
problemas familiares, falta de atividade física, dificuldades
financeiras, falta de controle e não apreciação da dieta. Apenas duas
participantes têm praticado caminhadas como atividade física. No
tocante a ingestão de gorduras e/ou frituras, uma ingere todos os dias e
duas, quase todos os dias. Doces; quatro, ingerem às vezes e uma,
todos os dias. Três ingerem massas todos os dias e duas, às vezes. Duas
responderam que se alimentam quando a comida lhe chama atenção, outras
duas, quando está com fome e uma em horários regulares. Com relação ao
estado emocional das pacientes: três afirmam que se sentem incapazes,
pois não estão conseguindo perder peso, mas mantém a esperança, e duas
sentem-se inseguras, pois não estão conseguindo perder peso como
gostaria.
Para
ilustrar as variáveis e os comportamentos que facilitaram ou
dificultaram a eliminação de peso, serão descritos, a seguir, dois
exemplos de pacientes situadas em pólos opostos. Uma será denominada C,
que conseguiu perder 6 kg e a outra NC, pois não conseguiu perder
peso.
Comparando
o 1º questionário (aplicado no início do tratamento) com o 2º, de
avaliação (aplicado 6 meses após o início do tratamento); a paciente C
deixou de pular refeições, passou a definir horários para realizá-las,
diminuiu a freqüência com que pensa em comida e a freqüência com que
repete as refeições. Além disso, passou a fazer pequenos lanches
durante o dia, envolvendo alimentos da dieta. Antes fazia apenas um,
envolvendo massas e doces. Acreditava que sua vontade de comer não é
mais aumentada, modificou-se para normal. Reduziu a ingestão de
gorduras e/ou frituras e doces, mas manteve a mesma freqüência de
ingestão de massas. Diversificou atividades para diminuir o estresse,
antigamente apenas rezava; passou, também, a ler, rezar e fazer
atividade física. Permaneceu fazendo caminhada, no entanto, diminuiu a
freqüência, fazia mais de 4 vezes e passou a 2 por semana. Afirma que
recebe apoio de familiares e amigos para perder peso e sente-se
fortalecida. Reconhece que o apoio é importante, contudo afirma que a
responsabilidade pela perda de peso é pessoal. A força de vontade é um
elemento que a tem ajudado significativamente. Permanece sob
acompanhamento nutricional e está satisfeita com o tratamento e com os
resultados. Revela ainda que a ansiedade tem dificultado sua perda de
peso e acredita que conseguiria melhores resultados se a diminuísse. É
importante salientar que C procurou tratamento em virtude das
conseqüências da obesidade. Manteve alguns comportamentos que
dificultam a perda de peso, tais como: permaneceu fazendo outra
atividade enquanto se alimenta, assistindo à televisão durante as
refeições, alimentando-se rápido e terminando as refeições antes das
outras pessoas.
A
paciente NC, passou a fazer mais de 3 refeições por dia e definir
horários para realizá-las, não está mais deixando de realizar
refeições. Está alimentando-se em horários regulares. Permanece
ingerindo doces, massas e gorduras e/ou frituras com a mesma
freqüência. Afirma que passou a comer mais devagar, no entanto
permanece sendo a primeira pessoa da família a terminar as refeições.
Passou a fazer dois lanches durante o dia, de acordo com a dieta.
Revelou que não obedece a dieta rigorosamente e não faz atividade
física. Passou a repetir as refeições. Atribui seu insucesso na perda
de peso a falta de condições financeiras para comprar os alimentos da
dieta, a problemas familiares e a falta de atividade física. Não está
recebendo apoio de familiares e/ou amigos para perder peso. Diante do
insucesso e da falta de apoio, sente-se incapaz e impotente. Afirma que
o apoio social é importante, principalmente da família, e gostaria de
tê-lo. Atribui sua dificuldade para perder peso a falta de condições
financeiras para manter a dieta. Assim como C, NC continua sob
acompanhamento nutricional e o que motivou a busca por tratamento também
foram as conseqüências da obesidade. Reconhece que poderia melhorar
seus resultados se seguisse às orientações da nutricionista e se
fizesse caminhadas.
Com
relação aos resultados da entrevista com os familiares, estes afirmam,
na primeira entrevista, em sua maioria, que as refeições são
realizadas em casa, na cozinha ou sala. Três familiares afirmam que a
família come reunida. Na maioria das vezes, é a paciente (obesa) quem
prepara as refeições e é ela quem escolhe o que será preparado.
Questionados
sobre como podiam ajudar na perda de peso, as respostas variaram entre
não saber, “mandar caminhar e colocar a dieta na porta da geladeira”,
incentivar, acompanhar na caminhada.
Perguntados
sobre como poderiam ajudar o paciente a seguir a dieta, os familiares
disseram ser importante incentivar, se adaptar também à dieta, fazer a
caminhada junto com o paciente, comprar a comida de acordo com a
orientação da nutricionista e, apenas um deles, afirmou não saber.
Porém, quando perguntados sobre o que estariam fazendo na prática para
ajudar o paciente na perda de peso, quatro familiares afirmaram não
fazer nada, apenas dar conselhos para fazer exercícios e não comer
demais. Apenas um entrevistado disse ter mudado o cardápio da casa,
comprando mais frutas e menos massas. Sobre o que seria importante fazer
para emagrecer, foram comuns respostas como “praticar atividade física
e controlar a alimentação” e “ter força de vontade”.
Os
familiares consideram importante fazer regime. É bastante citado que a
dieta deve ser feita somente até que o paciente adquira um bom peso e
que depois deve saber se alimentar para manter esse peso saudável.
Também ressaltam que o regime é importante para evitar prejuízos que a
gordura possa trazer à saúde.
Durante
a entrevista, foi pedido para que os familiares dissessem uma frase
que eles achassem que iria ajudar uma pessoa a perder peso. Algumas das
frases foram: “Conquiste sua saúde”, “Pratique esportes”, “Quando se
tem força de vontade se consegue tudo”.
Na
segunda entrevista, os familiares afirmaram que as refeições eram
realizadas em casa, na cozinha ou sala de jantar e que o paciente
continuou escolhendo e preparando as refeições. Os familiares disseram
que poderiam ajudar o paciente a perder peso “comprando frutas e
verduras”, “adaptando-se à dieta” e “dando dicas sobre a alimentação”.
Um dos familiares, no entanto, disse não saber como ajudar, segundo ele
“ninguém ajuda ninguém”.
Disseram
ser importante que os pacientes, para emagrecer, sigam uma dieta
alimentar de acordo com o que a nutricionista prescreve, façam
exercícios e se conscientizem, escolhendo comidas mais saudáveis. Os
familiares consideram uma dieta saudável e equilibrada importante na
manutenção e conquista da saúde.
Ao
serem questionados sobre o que faziam, na prática, para ajudar o
paciente a emagrecer, responderam não fazer nada, tentar conscientizar e
não falar “mais nada, pois a paciente não obedece ao tratamento”.
Entre
as frases que diriam para ajudar uma pessoa a perder peso estão:
“Tenha força de vontade, se você quiser, você perde peso”, “O
importante é ter consciência e perceber que já está prejudicando”,
“Ou pára de comer ou morre”.
Discussão
Os
dados coletados no início do tratamento sugerem que as pacientes
possuem um padrão de comportamento alimentar incorreto e
desorganizado. A maioria faz apenas 3 refeições diárias, não têm
horários definidos para fazê-las e deixam de realizar alguma. Efetuam
outra atividade enquanto se alimentam, repetem as refeições, se
alimentam na sala ou no quarto e comem rápido. Na literatura, estes
comportamentos, juntamente, com a falta de atividade física são
descritos como fatores que facilitam a acumulação de peso (Anderson
& Wadden, 2000; Ades & Kerbauy, 2002).
É
importante salientar também que todas as pacientes estão envolvidas
e/ou são responsáveis pela preparação da alimentação. Além disso,
todas possuem outro familiar em casa com excesso de peso; o que revela
um provável componente ambiental para a aquisição e acumulação do peso.
Apesar da amostra preocupar-se com o peso constantemente não há uma
seleção dos alimentos, tendo em vista que a maioria ingere doces,
gorduras e/ou fritura e massas todos os dias.
Um
dos aspectos mais importantes refere-se ao fator emocional, a maioria
considera sua vida diariamente estressada e refere-se a sentimentos
e/ou situações tais como: ansiedade, angústia, preocupação, solidão,
tensão/estresse, raiva e tristeza como desencadeadores da vontade de
comer. Estes dados sugerem a participação de um componente
significativo na aquisição e acumulação de peso, o estado emocional. Os
dados apontados sinalizam-se também concordantes com achados da
literatura, envolvendo a relação emoção e alimentação em pessoas
obesas. Por exemplo, Heller e Kerbauy (2000) relataram em um estudo com
08 pacientes de baixa renda, que estes relacionavam a ingestão de
alimentos a emoções, particularmente as desagradáveis. Anderson e
Wadden (2000), afirmam que sentimentos negativos podem fazer com que as
pessoas comam sem estar com fome. Concordante com esta proposição,
Stuart (1978/1999) aponta a ansiedade, a depressão, o tédio e a raiva
como emoções que desencadeiam um ciclo vicioso de tensão/comer/mais
tensão/mais comer. Acrescenta, ainda: “a maioria dos pesquisadores
acredita que os obesos tendem a ser mais emotivos que os magros e são
mais propensos a se voltar para a comida nas horas de tensão” (pág.
105).
Os
resultados do questionário de avaliação revelam que a maioria das
pacientes passou a fazer mais de 3 refeições diárias, inserindo lanches
de acordo com a dieta, definiram horários para as refeições,
diminuíram a freqüência com ingerem doces, massas e/ou frituras. No
entanto, afirmam que não obedecem rigorosamente a dieta e a maioria
permanece assistindo à televisão enquanto comem. Anderson e Wadden
(2000) ressaltam que além de modificar o que comem, é necessário mudar
quando, onde e como comem. Por exemplo, comer enquanto assiste à
televisão evita que as pessoas prestem atenção ao que e quanto comem.
Além disso, esse evento se torna associado ao ato de comer e pode
provocar a ingestão desnecessária de alimentos.
Com
relação à prática de atividade física, não houve modificações
importantes. No entanto, os sujeitos que praticaram atividade física,
conseguiram perder peso. Duchesne (2001) e Pinheiro et al. (2004)
afirmam que o aumento da obesidade está associado a uma diminuição do
gasto energético dos indivíduos, o que é resultado da urbanização e
seu impacto sobre os padrões de atividade física e alimentação;
predomínio de ocupações que demandam baixo gasto energético; e
diminuição da atividade física relacionada ao lazer.
Estes
resultados demonstram que as pacientes fizeram algumas modificações em
seu comportamento alimentar, no entanto estas modificações não foram
suficientes para garantir bons resultados, tendo em vista que apenas 2
pessoas conseguiram perder peso. Provavelmente a manutenção de
comportamentos inadequados, a quem pretende perder peso, tenham
dificultado o sucesso.
O
apoio social é uma variável que a amostra revela ser significativa.
Quem o recebe sente-se bem e fortalecida e por outro lado, quem não o
tem, sente-se impotente. As pacientes revelam conhecer o que é
necessário fazer para melhorar os resultados do tratamento, no entanto
este saber permanece no plano das idéias. Falta, ainda, ação e
execução.
Com
relação às pacientes C e NC, ambas modificaram alguns comportamentos.
Contudo, identificam-se algumas diferenças em seus comportamentos que
provavelmente tenham interferido no resultado final. A paciente C
diminuiu a freqüência com que repete as refeições e a ingestão de
doces e gordura e/ou frituras, diversificou atividades para diminuir o
estresse, pratica atividade física, recebe apoio de familiares e/ou
amigos. No entanto, C permanece assistindo à televisão enquanto come,
alimenta-se rápido. Por outro lado, NC passou a fazer mais 3 refeições
diárias, alimenta-se mais devagar. Em contrapartida, passou a repetir
as refeições e permaneceu ingerindo com a mesma freqüência doces,
massas e fritura e/ou gorduras, não pratica atividade física e não
recebe apoio social.
Vale
salientar que as duas pacientes deixaram de pular refeições e passaram
a definir horários para alimentar-se. Observa-se que C, que conseguiu
perder peso, fez mais modificações em seus comportamentos, se comparada
com NC, que não conseguiu perder. Aparentemente, são pequenas
modificações comportamentais que, associadas à atividade física, fez
com que C produzisse bons resultados.
É
importante destacar que algumas pacientes justificam seu insucesso,
com a falta de condições financeiras para manter a dieta. Este dado é
concordante com o estudo de Heller e Kerbauy (2000), no qual
identificaram fatores socioeconômicos como uma das dificuldades
apontadas pelos pacientes, para seguir um programa, tendo em vista o
custo elevado de frutas, verdura e alimentos hipocalóricos. Isto é uma
realidade e reflexo das péssimas condições de vida da população
brasileira. A maioria realmente não tem condições para adquirir
alimentos necessários a uma dieta para emagrecimento. No entanto,
deve-se buscar alternativas e orientar os pacientes para amenizar as
interferências da falta de condições financeiras.
Percebeu-se,
portanto, que não se identificou mudanças relevantes no que diz
respeito à atitude dos familiares perante os pacientes em tratamento.
Eles demonstraram, nos dois momentos, entender que a obesidade é
prejudicial à saúde e saber que o apoio familiar é importante no seu
tratamento. No entanto, na prática, consideram a responsabilidade pela
perda de peso num nível individual, atribuindo grande importância à
força de vontade nos pacientes. Isto é confirmado pelo relato de
Anderson e Wadden (2000), que afirmam que o público acredita que a
perda de peso é uma questão de força de vontade e considera obesos
fracos e desmotivados, visão esta reforçada pelas revistas e produtos
de dieta que prometem o emagrecimento fácil. É importante salientar que
os familiares fornecem apoio com conselhos e sugestões do que deveria
ser feito. No entanto, Stuart (1978/1999) afirma que os membros da
família influenciam os comportamentos uns dos outros, portanto devem
dar exemplos com ações e atos que instiguem comportamentos mais
saudáveis. Provavelmente uma intervenção que orientasse os familiares
quanto ao tratamento da obesidade e sobre a importância do apoio
social, produzisse melhores resultados, pois se teria uma pessoa,
familiar, para acompanhar, incentivar e reforçar com mais freqüência os
pacientes.
Em
resumo, observa-se que as pacientes estão inseridas em um contexto
propício à acumulação de peso: padrão de comportamento alimentar
incorreto e desorganizado, falha no autocontrole desse comportamento,
influência do estresse e de sentimentos negativos e ausência de apoio
social e familiar na perda de peso e conseqüentemente na manutenção.
Assim, comprova-se que a obesidade é uma condição complexa, na qual
estão envolvidos múltiplos fatores e o tratamento é difícil, uma vez
que requer mudanças comportamentais e de hábitos pelo resto da vida.
Os
dados apresentados nesse trabalho são ainda iniciais, pois a amostra
ainda é reduzida, merecendo assim mais estudos, em busca de conclusões
acerca da dificuldade em perder e manter o peso e a importância do
apoio social.
Recebido em: 10/04/2005
Aceito em: 21/06/2005
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