Filme: Preciosa - Uma História de Esperança
A história: Clareece "Precious" Jones (interpretada por Gabourey Sidibe) é negra, pobre, morbidamente obesa e disléxica. Adolescente, é maltratada pela mãe (interpretada por Mo'Nique, ganhadora do Oscar de atriz coadjuvante), que passa o dia inteiro vendo TV, dependendo da caridade do governo e pouco se importando com a filha, a não ser para manter o seu benefício. Por esses e outros motivos (que não dá pra falar sem soltar spoilers, mas que são mostrados no decorrer do filme), Precious é fechada, sem amigos, sendo que seu único escape são alguns sonhos/devaneios, onde ela é famosa, tem um namorado branco e rico, etc.
Logo vemos que, apesar de ainda estar no equivalente ao ensimo médio, Clareece já teve um filho e está esperando outro, por isso, é "expulsa" da atual escola. E é aí que começa uma nova etapa na vida de Preciosa. Na nova escola, uma escola meio experimental (e meio hippie, diria eu), ela conhece a professora Rain (Paula Patton), que através da leitura e principalmente da escrita, se importando realmente com Preciosa, irá começar a desencadear grandes mudanças na vida da protagonista.
Entretanto, não ache que o filme cai em fórmulas prontas ou clichês fáceis. A mudança que se desencadeia na protagonista é lenta e por vezes, achamos que, como na vida real, ela irá desistir e voltar atrás. Aliás, realidade é o ponto forte do filme: os personagens são verossímeis, suas reações, totalmente humanas, e principalmente, não existe fórmula pronta ou fácil de um final feliz. Se é que há um final feliz.
Preciosa - Uma História de Esperança é um drama forte, realista e que é tecnicamente, perfeito. Eu, como um chato, tentei encontrar defeitos, mas não consegui. Talvez o seu único defeito seja o inerente ao que se propõe: como é um drama pesado e realista, provavelmente não vai agradar a todos. Não é o tipo de filme que você sai leve do cinema; não, é o tipo de filme que, ao terminar a sessão, você sente que levou um soco no estômago. Ou, no caso deste filme, uma verdadeira pancadaria.
Enfim, se você for assistir Preciosa - Uma História de Esperança, saiba o que te espera: um drama mais pesado que a protagonista (ok, agora sim, trocadilho intended), que até chegar à redenção, vai te levar por caminhos bem tortuosos. As 6 indicações (e o 1 prêmio) do Oscar não foram à toa.
Preciosa está cozinhando de costas para a mãe e esta lhe arremessa um objeto pesado na cabeça, sem motivo algum. Ela cai no chão e se lembra de uma cena na qual o pai, com o corpo suado, a estupra dizendo: “Papai te ama”. Um detalhe importante mostra a mãe assistindo o estupro da porta do quarto sem nada fazer. Em todos os momentos insuportáveis como este, Preciosa se imagina em cenas grandiosas, nas quais ela é uma celebridade. Neste momento, por exemplo, ela se imagina uma estrela de cinema desfilando num tapete vermelho, sendo assediada por fotógrafos e repórteres. Ela se transporta para uma situação na qual tem importância, é reconhecida e admirada pelas pessoas como forma de suportar a realidade na qual ela é apenas um objeto para satisfação dos desejos dos outros.
Então, começa um novo dia. Preciosa pensa: “Ontem eu chorei. É por isso que Deus, seja lá quem for, faz outros dias”. A partir daí uma mudança se inicia quando Preciosa começa a frequentar a escola alternativa. Quando ela entra para a sala de aula no primeiro dia, a cena fica iluminada com cores vibrantes em contraste com a atmosfera opressiva de casa. Preciosa se apresenta e diz que é a primeira vez que fala numa sala de aula e a professora Blu Rain pergunta a ela como se sente. Preciosa responde: “Isto me faz sentir aqui”. A relação da professora Rain com Preciosa é de extrema valia para que esta comece a se fortalecer e a pensar em novas perspectivas para a sua vida. Preciosa diz: “Minha mãe diz que a escola não presta. Ela está enganada. Eu estou aprendendo”. Preciosa pensa nos filhos e começa a ter vontade de ser uma boa mãe e transmitir coisas positivas para eles. Ela vê na TV um discurso de Martin Luther King (“Eu ainda tenho um sonho”) e diz que tem vontade de ensinar isto aos filhos. Enquanto está grávida do segundo filho diz: “Ouça bebê, a mamãe não é idiota”. Preciosa consegue aos poucos se libertar da relação de dominação com a mãe. Depois que nasce seu segundo filho, ela enfrenta a mãe e sai de casa, passando uma temporada na casa da professora Rain. Esta mora com sua companheira e, quando Preciosa é acolhida pelas duas pensa: “Porque pessoas que mal me conhecem são mais legais comigo do que meus pais? Mamãe diz que os homossexuais são gente ruim. Mamãe: os homossexuais não me violentaram!”
*Érico Douglas Vieira é Psicólogo e Psicodramatista. Professor do curso de Psicologia da Universidade Federal de Goiás - Campus Jataí. E-mail: ericopsi@yahoo.com.br
As palavras da Preciosa após o estupro: “Ontem eu chorei.
é só recomeçar qualquer projeto que sonhou,
que seja emagrecer por exemplo,
então ... sem cobranças, sem culpas ... é só r-e-c-o-m-e-ç-a-r ...
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