Resumo
Introdução
Obesidade e Imagem Corporal
Tendo por base a definição de Schilder (1980), a imagem corporal é "a figura do nosso corpo formada na nossa mente, ou seja, o modo pelo qual o corpo se apresenta para nós". Ele refere que apesar desta imagem ser adquirida através dos nossos sentidos (um componente ligado à percepção), ela não está separada das representações mentais. Isto dá um sentido psicológico à imagem corporal e um significado para o conhecimento interior do corpo. É desta forma, também, que o modelo postural transfere a base de atitudes emocionais para o nosso corpo.
Weiss et al (1986) ainda aponta como indicativos de distúrbios da imagem corporal: a excessiva preocupação da pessoa pela sua obesidade; o peso é o que mais lhe interessa; a dificuldade para se ver no espelho; não se reconhecer no seu tamanho real quando engorda ou emagrece. Este autor denota que algumas pessoas, cujo excesso de peso tem início na vida adulta, mantêm uma imagem na memória enquanto magras. A imagem corporal destas pessoas, fixada na infância, aparece como imutável, apesar da realidade ser outra, a de estarem de facto obesas. Esta negação inconsciente da realidade bloqueia o progresso na direcção do emagrecimento ou de se fazer uma dieta. Além disso, o que parece motivar as pessoas para emagrecer, e daí para se manterem magras, está relacionado com sua habilidade em ter uma imagem real, substituindo a distorção da imagem corporal.
De acordo com os estudos realizados por Hoyos & Clarke (1987), Collins et al (1983), a associação entre obesidade e distúrbios da imagem corporal estabelece-se tanto pela superestimação, quanto pela subestimação da imagem corporal. Está relacionada, tanto a aspectos psicológicos, quanto a sociais, que sofrem a interferência dos padrões de beleza. Talvez por este motivo o fenómeno apareça mais entre mulheres, uma vez que a sociedade exige delas, uma aparência mais perfeita.
Estudos na área da psicologia demonstram-nos que se uma pessoa se sente gorda demais, tem mais probabilidade de se deprimir. Por outro lado, há pesquisas que demonstram, que indivíduos que se alimentam bem, que fazem exercícios regularmente e que se sentem bem com seu corpo, tendem a ter maior auto-estima (J.A.M.A., 2005).Tudo parece ser um ciclo que vai emendando de uma ponta à outra: quem tem uma alimentação saudável sente-se melhor, quem se sente melhor tem mais disposição para fazer exercícios, quem se exercita e relaciona melhor com o seu corpo, que por sua vez se relaciona melhor com sua alma, e com isso se sente mais disposto para fazer projectos, planos e desejar uma vida melhor. O resultado será uma vida mais saudável, tanto no trabalho, como na família, como na cama.
É este conjunto de bons resultados que desejamos quando exercemos uma alimentação saudável e a prática de exercícios físicos. Quem não está bem com o seu corpo, não tem vontade para fazer planos, sair, visitar amigos, nem se quer, inclusive, fazer sexo.
Satisfação Alimentar / Sexual e Obesidade
A comida já é por si um prazer. Entretanto, ela pode converter-se numa substituição do prazer sexual.
Especificamente relacionado ao prazer sexual, a literatura indica-nos que a ingestão excessiva de alimentos: 1) pode ter a ver com uma resposta contra nossas insatisfações sexuais; 2) pode ser uma forma de esconder os nossos desejos sexuais; 3) pode servir de escudo para escaparmos ao sexo (Stuart & Jacobson, 1990).
Muitas mulheres protestam quando são tocadas fisicamente ou de quando vistas enquanto gordas pelos seus maridos, contribuindo para a insatisfação das relações sexuais. Assim, Freedman (1991) refere que quando a mulher passa a aceitar seu corpo, há uma permissão a uma vida sexual mais saudável.
Embora a comida seja considerada como uma fonte de prazer, Cassius (1990) explica que quem come demais, perdeu a capacidade de sentir prazer. Isto ocorre porque cada vez mais se tende a comer mais rápido e em grandes quantidades; sente-se culpado por isso; desespera-se por perder o controle; forma-se um círculo vicioso, come-se mais rápido para não se sentir culpado. A crítica que o obeso recebe por comer demais, vai interferir na permissão interna de sentir prazer. Isto pode, talvez, influenciar na sensação de outros tipos de prazer.
Lowen (1979) interpreta a necessidade de comer em excesso da seguinte forma: “Nem todas as pessoas frustradas sexualmente comem exageradamente. Porém o inverso é verdade, todas as pessoas que comem compulsivamente e em demasia, não se encontram sexualmente satisfeitas. O indivíduo que está em contacto com o seu corpo percebe as suas verdadeiras necessidades e age racionalmente para satisfazê -las".
Hormonas Sexuais na Obesidade
Nos homens, a redução da função testicular diminui o desejo sexual e a produção de sémen. Nas mulheres, níveis reduzidos de estrógenio atrasam a maturidade sexual, diminuem o tamanho das mamas e retardam o amadurecimento dos óvulos. O desequilíbrio estrógeno-progesterona pode promover muitos sintomas e alterações do ciclo menstrual (Lordelo, 2007).
Eixo hipotálamo-hipófise-adrenal
O eixo hipotálamo-hipófise-adrenal apresenta-se hiper-responsivo nos indivíduos obesos. Observa-se resposta aumentada do cortisol a estímulo com ACTH (corticotrofina, hormona adrenocorticotrófica) e CRH (hormona que liberta corticodropina). Há maior frequência na liberação dos pulsos de ACTH, com menor amplitude de pulso, mas o nível basal é normal (Lordelo, 2007).
Existem diversas evidências na literatura de que há uma maior activação do eixo HHA (eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal) em pacientes obesos, particularmente naqueles com distribuição central de gordura (Lordelo, 2007).
Lordello (2007), demonstrou que mulheres com obesidade central apresentaram um aumento significativo de cortisol e ACTH após estímulo com CRH em relação a não obesas, ou mulheres com obesidade periférica. Não é conhecido se esta alteração influencia a libertação de cortisol pelas glândulas adrenais.
Gonadotrofinas e Esteróides sexuais no adulto:
Serão descritas as peculiaridades do metabolismo estrogénico e androgénico no obeso adulto em ambos os sexos. As gonadotrofinas, de modo geral, são normais ou apresentam alterações discretas. Anovulação crónica e infertilidade são associadas à obesidade. A SOP (síndrome dos ovários policísticos) é responsável pela maior parte dos casos de infertilidade (Lordelo, 2007).
- Gonadotrofinas:
Homens com obesidade grave têm níveis de testosterona livre baixos sem concomitante aumento de LH (hormona luteinizante), sugerindo um estado de hipogonadismo hipogonadotrófico. As alterações são reversíveis com perda ponderal (Lordelo, 2007).
Em algumas mulheres obesas, após a menopausa, observam-se níveis de gonadotrofinas menores do que o esperado na condição de falta de retroalimentação negativa estrogénica (Lordelo, 2007).
- Esteróides sexuais:
Na obesidade, a produção androgénica adrenal e ovariana encontra-se elevada, apresentando correlação positiva com o Índice de Massa Corporal. Nas mulheres, a obesidade abdominal é fortemente associada a hiperandrogenemia (Lordelo, 2007).
Nos homens, entretanto, a produção androgénica testicular é reduzida, apresentando correlação inversa com o grau de obesidade abdominal (Lordelo, 2007).
A globulina de ligação de hormonas sexuais (SHBG) encontra-se diminuída em indivíduos obesos causando grande impacto no metabolismo e na acção dos esteróides sexuais. Esta alteração pode também facilitar o aumento do clearance androgénico. A diminuição da SHBG decorre de menor produção hepática e correlaciona-se inversamente com IMC, hiperinsulinemia e relação cintura-quadril (Lordelo, 2007).
Há maior quantidade de testosterona livre (bioactiva) nas mulheres. Em homens moderadamente obesos, a testosterona total é baixa devido à redução de SHBG, mas a testosterona livre é normal. Como já mencionado, a testosterona livre poder ser reduzida em obesos graves (IMC>40) devido à redução de frequência e amplitude de pulso de LH nesses indivíduos (Lordelo, 2007).
A aromatização, reacção enzimática responsável pela conversão de androgénios a estrogénios, ocorre no tecido adiposo de homens e mulheres (tanto na pré como na pós menopausa) e é fortemente relacionada ao peso corporal (Lordelo, 2007).
Os níveis de estrogénios totais são iguais aos de mulheres magras, mas a fracção livre encontra-se aumentada. Níveis de estrogénios também são elevados em homens obesos, mas não ocorrem sinais de feminilidade (Lordelo, 2007).
Em mulheres após a menopausa, os níveis de estrona e estradiol apresentam correlação com o grau de obesidade (Lordelo, 2007).
O tecido adiposo é um grande reservatório de esteróides, já que eles se concentram mais preferencialmente nos adipócitos do que no plasma (a concentração de esteróides na gordura é 2–13 vezes maior do que no plasma), e o volume de gordura no obeso é muito maior que o espaço intravascular (Lordelo, 2007).
Antes de mais é importante compreender a função dos androgénios, na sexualidade da mulher. Os androgénios, actuam no sistema límbico e aumentam a libido, a disposição física e o bem-estar geral. Perifericamente, ao aumentar a libido, promovem a lubrificação vaginal durante a interacção sexual, uma vez que esta corresponde à primeira fase do ciclo da resposta sexual feminina e não depende da presença de estrogénio. Actuam também directamente sobre o clítoris provocando a tumescência e estimulando a sua hipertrofia.
Desejo e Aversão Sexual na Obesidade
No caso deste trabalho em particular, em que o foco central é a obesidade, estes dois transtornos que iremos descrever estão presentes na sexualidade do obeso em associação de causas orgânicas e não orgânicas, pois no caso da mulher obesa adulta entendemos que as alterações são a nível psicológico, não orgânico, em que os seus transtornos sexuais se baseiam na questões de imagem corporal e auto-estima; no caso do homem obeso adulto detemos a causa como orgânica, havendo uma notória alteração hormonal que torna negativo o seu comportamento sexual.
Embora exista uma série de causas diferentes, a forma de apresentação clínica pode variar apenas entre dois quadros distintos: o desejo sexual hipoactivo e a aversão sexual.O desejo sexual hipoactivo é a diminuição ou ausência total de fantasias e de desejo de ter actividade sexual (DSM-IV-TR, 2002). Simplesmente, a pessoa sente que lhe é indiferente ter sexo ou não, pois não é uma necessidade intrínseca. Há um grande sofrimento por sentir desmotivação e, sobretudo, pelos problemas que causa na conjugalidade.
A aversão sexual nada mais é do que o sofrimento causado pela permanente necessidade de evitamento de oportunidades e encontros sexuais com parceiros, devido a sensações de desagrado, medo, "nojo", repulsa e perigo iminente (DSM-IV-TR, 2002). Por vezes, a razão da repulsa são as secreções genitais; em outros casos, o simples pensar em sexo, o toque ou o beijo já é evitado com angústia. Também podem surgir sinais de pânico, como náuseas, suor excessivo e falta de ar quando a pessoa tenta enfrentar esse medo, aproximando-se do seu parceiro.
Ponderar o Tratamento …
Sugerimos uma linha cognitivo-comportamental, sendo que todos os comportamentos vêm de respostas a estímulos. No que se refere ao comportamento alimentar, deve evitar-se a associação a outros estímulos prazerosos ao acto alimentar.
No campo da sexualidade, deve dar-se a conhecer ao sujeito a ligação desta com a obesidade, as influências que o seu índice de massa corporal tem no seu desempenho sexual. Depois do sujeito iniciar a terapia com a finalidade de solucionar a sua problemática alimentar, deveria ser questionada a génese do possível transtorno sexual, para que este fosse tido em conta como uma problemática relacionada com o seu problema de obesidade.
Como foi descrito anteriormente, os transtornos sexuais relacionados com a obesidade reflectem-se em perturbações do desejo sexual (desejo sexual hipoactivo e aversão sexual), perturbações da excitação sexual (perturbação da excitação sexual na mulher e disfunção eréctil no homem). Quando predomina uma problemática sexual feminina na obesidade, estamos perante uma génese psicológica, pois a explicação endocrinológica revela-nos que a mulher obesa adulta produz hormonas sexuais em excesso, o que é promotor de aumento de desejo e funcionamento sexual. Contudo quando isto não acontece (aumento de desejo) é indicador de síndrome psicogénica, revelando os factores sociais, do corpo, crenças enraizadas que se escondem por detrás da sua gordura, e que afastam a mulher de qualquer contacto íntimo / sexual. Assim sendo, se ao iniciar a terapêutica de emagrecimento e ao perder peso não sentir diferenças na sua sexualidade, na sua imagem / auto-confiança, e permanecerem transtornos sexuais, será aconselhada mais tarde a terapia sexual.
O homem obeso adulto, apresenta um deficit de hormonas sexuais que induz numa diminuição da libido e da actividade sexual, o que pode promover desejo hipoactivo, não obstante, poderá promover disfunção eréctil, nomeadamente por doenças com especial risco vascular (hipertensão arterial, dislipidémias), endocrinopatias (diabetes, aumento de estrogénios). Neste caso, semelhante ao anterior, é aconselhada a diminuição de peso, pois é o factor de conflito em várias doenças associadas por consequência. Em seguimento da sugestão para o emagrecimento é necessário controlar todas as patologias associadas à obesidade, posteriormente, com o tratamento médico para o emagrecimento, será notória a homeostase do funcionamento sexual. Caso isso não aconteça, será aconselhado a terapia sexual com a finalidade de superar as problemáticas que não foram colmatadas pela assistência médica.
Concluindo…
Logo podemos ponderar, sobre a libido das mulheres obesas, que pela explicação endocrinologica atrás descrita, estas mulheres apresentam um aumento muito elevado de androgénios, o que pode traduzir um possível aumento de desejo sexual e posterior desempenho da actividade sexual.
O desejo sexual feminino é fortemente androgeniodependente, ainda que alguns aspectos como concentrações e locais centrais suscitem algumas dúvidas (Martins, 2003). Para além do aumento de androgénios, predomina também um elevado número de testosterona livre (bioactiva) nas mulheres obesas, promovendo assim, um elevado desejo / função sexual, e bem-estar.
Em relação à libido do homem obeso adulto, explicitado anteriormente, também na área de endocrinologia verificamos que a produção androgénica testicular é reduzida, a testosterona total é baixa e a testosterona livre é bastante reduzida em obesos graves (IMC>40), o que nos dá conta de um efeito negativo sobre o desejo e fantasias sexuais (Martins, 2003)
A investigação, em particular, centrou-se na obesidade, enquanto consequência de uma alimentação excessiva. No entanto, deve promover-se uma mudança; o estudo da sexualidade no contexto da obesidade, passagem para a análise da qualidade da função sexual na obesidade. Já é notória uma compreensão da sexualidade ao analisar os factores psicológicos subjacentes, que predizem uma má qualidade funcional no campo da sexualidade, mas é importante que a investigação vá mais longe neste campo, para que seja mais clarificada a obesidade e as suas atenuantes, quer a nível hormonal quer no que respeita a danos colaterias / doenças a ela associadas.
Questionamos se o sujeito obeso reflecte sobre a sua sexualidade; sobre a sexualidade do seu próximo; sobre a forma como pensa o seu corpo; sobre como é a saúde do seu corpo interno; sobre como se comportam as suas hormonas, etc.
A área da sexualidade é muito vasta, mas está sempre presente na vida do ser humano, daí a necessidade de compreender o ser humano em todas as suas dimensões.
A obesidade, sobretudo no seu estado de gordura mórbida prejudica a actividade sexual, destaca-se assim a necessidade da prática de uma alimentação saudável como condicionante para a manutenção de uma actividade sexual regular e que pelo esforço físico despendido não coloque em causa a saúde.
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