Linhaça: Um alimento funcional que faz bem ao coração
Dra. Jocelem Mastrodi Salgado
Profa. Titular de Nutrição - LAN/ESALQ/USP
Presidente da Sociedade Brasileira de Alimentos Funcionais SBAF
Importantes estudos científicos têm apontado diversos componentes bioativos e nutrientes presentes em alguns alimentos, com propriedades para reduzir o risco de certas doenças e melhorar a qualidade de vida das pessoas.
As pesquisas demonstram que o consumo regular de fibras, antioxidantes, ácidos graxos ômega-3, entre outras substâncias, associado a uma dieta balanceada, com baixo teor de gorduras e calorias, é capaz de manter o peso adequado e prevenir contra doenças como as cardiovasculares, o diabetes e até mesmo o câncer.
Dentre os alimentos que estão sendo investigados, a linhaça tem se destacado por apresentar várias evidências científicas acerca de seus benefícios para a saúde.
Existem dois tipos de semente de linhaça: a dourada e a marrom. Não existem diferenças na composição dos dois tipos, já que as duas são compostas pelos mesmos nutrientes e mantém o mesmo potencial funcional. Contudo, acredita-se que a variedade marrom, cultivada principalmente em regiões de clima quente e úmido como no Brasil, apresente uma casca mais resistente que a variedade dourada, plantada em regiões frias como no Canadá. Além disso, a forma de cultivo pode ser fator de diferenciação: enquanto a dourada geralmente é cultivada de forma orgânica e apresenta um sabor geralmente mais suave, a variedade marrom frequentemente exige o uso de agrotóxicos e apresenta sabor mais forte.
Presença de nutrientes funcionais
A semente de linhaça tem se destacado como um alimento funcional, uma vez que apresenta alguns nutrientes específicos que podem trazer diversos benefícios à saúde. Fonte de ácidos graxos ômega 3 e 6, a linhaça também é rica em minerais, vitaminas, fibras e lignanas, compostos associados às fibras.
A semente contém cerca de 37 a 42% de gordura em sua composição, sendo que aproximadamente 70% são do tipo polinsaturada, composta especialmente pelos ácidos graxos ômega 3 e 6, dois tipos de gorduras essenciais que não podem ser produzidas pelo organismo.
Cerca de 57% do conteúdo de ácidos graxos da semente é composto pelo ácido alfa-linolênico (ALA), um ácido graxo ômega 3 que é essencial para o funcionamento das células. Os estudos mostram que esse ácido graxo auxilia no controle dos níveis de triglicérides e colesterol, além de favorecer a diminuição da inflamação e reduzir a agregação plaquetária, tornando o sangue mais fluído e evitando a formação de trombos. Dessa forma, o consumo regular de linhaça contribuiria para a prevenção de doenças cardiovasculares e a melhora da qualidade de vida das pessoas em geral.
Rica em carboidratos complexos, a presença das fibras (27g para cada 100g) é outro ponto positivo da semente, que apresenta baixo índice glicêmico. A excelente quantidade e a boa proporção entre as frações de fibras solúveis e insolúveis, auxiliam na diminuição do colesterol, no controle da glicemia e no bom funcionamento do intestino. Além disso, as fibras em geral têm sido associadas a outras funções no organismo, como a promoção da saciedade e controle da ingestão alimentar.
Finalmente, um outro componente importante da linhaça são as lignanas, compostos que dão origem no trato intestinal a duas lignanas mamíferas: o enterodiol e seu produto oxidado, a enterolactona. Essas duas substâncias, que se formam da ação bacteriana sobre a lignana vegetal da linhaça, são estruturalmente similares tanto aos estrogênios sintéticos como aos de ocorrência natural e parecem possuir atividades estrogênicas fracas e antiestrogênicas, podendo desempenhar resultados positivos para constipação, no tratamento da tensão pré-menstrual, na menopausa e na prevenção de cânceres dependentes de estrogênios. Contudo, mais estudos nessa área são necessários para se comprovar esses efeitos.
Estudos clínicos na área cardiovascular
Vários estudos têm sido conduzidos com o objetivo de avaliar os efeitos do consumo de linhaça sobre marcadores de risco em pessoas hipercolesterolêmicas. A conclusão de grande parte deles é que o alimento, preferencialmente moído, em forma de farinha, reduz o risco de doenças cardiovasculares, principalmente por diminuir os níveis de LDL-colesterol, colesterol total e marcadores de inflamação como a proteína C reativa (PCR).
Dentre esses estudos, uma pesquisa1 com 62 homens e mulheres com LDL-colesterol entre 130-200 mg/dl avaliou o consumo de linhaça moída sobre alguns marcadores de risco cardiovascular durante dez semanas. Um grupo recebeu 40g/dia do alimento adicionado a produtos cozidos, enquanto que o outro fez uso de produtos à base de farelo de trigo. Ambos os grupos seguiram uma dieta pobre em gordura e baixa em colesterol. Comparada com o farelo de trigo, a linhaça reduziu o LDL-colesterol em 13% na quinta semana do estudo e 7% no final das dez semanas. Houve também uma redução da lipoproteína A (14%) e da taxa de resistência à insulina (23,7%).
Em um outro estudo2, o objetivo foi investigar se o consumo de 30g de linhaça por mulheres americanas na menopausa, afetava positivamente seus perfis lipídicos. Cinqüenta e cinco mulheres foram distribuídas em 3 grupos: o primeiro era um grupo controle, o segundo usou linhaça e o terceiro consumiu linhaça + fibra de farelo de aveia durante 3 meses. Os resultados mostraram que a suplementação com linhaça diminuiu o colesterol total e o LDL- colesterol em aproximadamente 7 e 10%, respectivamente.
O efeito do consumo diário de linhaça sobre as concentrações plasmáticas de lipídios em pacientes com hiperlipidemia moderada também foi avaliado em outra pesquisa3. Quarenta pessoas com colesterol plasmático maior que 240mg/dl foram distribuídas em 3 grupos: o primeiro seguiu apenas uma dieta equilibrada, adequada para pessoas com hiperlipidemia; o segundo, além de seguir a mesma dieta, utilizou estatinas; o terceiro grupo seguiu a mesma dieta + 20g de linhaça moída por dia. Após dois meses de estudo, os autores concluíram que a suplementação com linhaça foi associada com reduções significantes de colesterol (17,2%), LDL-colesterol (3,9%), triglicérides (36,3%) e taxa de colesterol/ HDL (33,5%). Com exceção dos triglicérides, não houve diferenças significativas entre o grupo usando linhaça e o grupo com estatinas em relação aos demais parâmetros avaliados.
Quanto e como consumir
As pesquisas mostram que os benefícios da linhaça se potencializam quando a semente é moída ou triturada, pois como a casca da semente é muito dura, sua digestão é comprometida podendo passar direto pelo trato gastrointestinal, reduzindo a absorção de seus nutrientes. A semente moída (farinha) deve ser mantida sob refrigeração e longe da luz, para evitar a oxidação das gorduras.
Com relação à quantidade ideal de consumo, ainda não existe um consenso. Na maioria dos estudos avaliados, os benefícios foram alcançados com a ingestão média de uma a duas colheres (sopa) de farinha de linhaça ao dia. A linhaça pode ser adicionada a saladas de frutas, sopas, mingaus, iogurtes, vitaminados ou usada para compor receitas de bolos, biscoitos, pães e barras de cereais. Para facilitar a adaptação e digestão, recomenda-se que a inclusão da linhaça na alimentação diária seja gradativa.
Por último, é importante ressaltar que algumas propriedades funcionais da linhaça são encontradas na casca e, portanto, não estão presentes quando somente o óleo na forma de cápsulas é ingerido.
Referências Bibliográficas
1. Bloedon LT, Balikai S, Chittams J et al. Flaxseed and cardiovascular risk factors: results from a double blind, randomized, controlled clinical trial. J Am Coll Nutr., v.27, n.1, p.65-74, 2008.
2. Patade A, Devareddy L, Lucas EA et al. Flaxseed reduces total and LDL cholesterol concentrations in Native American postmenopausal women. J Women Health., v.17, n. 3, p. 355-66, 2008.
3. Mandasescu S, Mocanu V, Dascalita AM et al. Flaxseed supplementation in hyperlipidemic patients. Rev Med Chir Soc Med Na Iasi., v.109, n3, p.502-6, 2005.
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