OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:

Os textos a seguir são dirigidos principalmente ao público em geral e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes de cada assunto abordado. Eles não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores às informações aqui encontradas.

Mens sana in corpore sano ("uma mente sã num corpo são") é uma famosa citação latina, derivada da Sátira X do poeta romano Juvenal.


No contexto, a frase é parte da resposta do autor à questão sobre o que as pessoas deveriam desejar na vida (tradução livre):

Deve-se pedir em oração que a mente seja sã num corpo são.
Peça uma alma corajosa que careça do temor da morte,
que ponha a longevidade em último lugar entre as bênçãos da natureza,
que suporte qualquer tipo de labores,
desconheça a ira, nada cobice e creia mais
nos labores selvagens de Hércules do que
nas satisfações, nos banquetes e camas de plumas de um rei oriental.
Revelarei aquilo que podes dar a ti próprio;
Certamente, o único caminho de uma vida tranquila passa pela virtude.
orandum est ut sit mens sana in corpore sano.
fortem posce animum mortis terrore carentem,
qui spatium uitae extremum inter munera ponat
naturae, qui ferre queat quoscumque labores,
nesciat irasci, cupiat nihil et potiores
Herculis aerumnas credat saeuosque labores
et uenere et cenis et pluma Sardanapalli.
monstro quod ipse tibi possis dare; semita certe
tranquillae per uirtutem patet unica uitae.
(10.356-64)

A conotação satírica da frase, no sentido de que seria bom ter também uma mente sã num corpo são, é uma interpretação mais recente daquilo que Juvenal pretendeu exprimir. A intenção original do autor foi lembrar àqueles dentre os cidadãos romanos que faziam orações tolas que tudo que se deveria pedir numa oração era saúde física e espiritual. Com o tempo, a frase passou a ter uma gama de sentidos. Pode ser entendida como uma afirmação de que somente um corpo são pode produzir ou sustentar uma mente sã. Seu uso mais generalizado expressa o conceito de um equilíbrio saudável no modo de vida de uma pessoa.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Mens_sana_in_corpore_sano


terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Diário de um médico que era gordo

Artigo

O médico canadense Ben Williams, que chegou a pesar 145 quilos, conta como precisou de ajuda para deixar de ser obeso

Ben Williams*
Diante de um paciente obeso, é tentador explicar a matemática: eles precisam comer menos e se exercitar mais. Por mais que isso seja verdade, é quase inútil. Eu também quero que esses pacientes deixem de lado os Venti Mochas (bebida de café altamente calórica) e coloquem suas roupas de academia. Mas eu tento me lembrar de que esse conselho não foi útil para mim, e dificilmente será para meus pacientes obesos. Durante toda a minha vida, dos meus seis anos até dois anos atrás, eu era realmente gordo. Agora não sou mais.

Quando vejo fotos antigas, percebo que algo grande aconteceu com a minha família quando eu estava entrando na idade escolar. Nós crescemos. Bem, as crianças cresceram verticalmente, mas a família inteira cresceu horizontalmente. Eu mais do que todos. No ensino fundamental, eu ganhei apelidos nada elogiosos. No ensino médio, eu estava próximo dos 136 quilos.

Depois do ensino médio, eu estudei canto, onde não era incomum ser gordo. E eu ainda estava na extremidade mais elevada da escala. Mais tarde, trabalhei como auxiliar de um político nos últimos dias de governo do Partido Democrático da Columbia Britânica (British Columbia New Democratic Party, NDP, um partido de orientação social democrata do Canadá). Na política, aparência importa, e embora homens acima do peso fossem uma norma, minha obesidade estava acima da média.

Em 2001, o NDP ficou reduzido a duas cadeiras na legislatura, e meu hábito de fumar tinha aumentado para dois maços por dia. Depois que parei de fumar, meu peso aumentou ainda mais. Quando mais tarde voltei a estudar, indo a uma universidade comunitária à noite e trabalhando durante o dia, nunca consegui achar tempo para ter um estilo de vida saudável. Eventualmente, fui aceito na faculdade de medicina onde era tudo menos normal ser gordo.

Antes mesmo da faculdade de medicina, eu já sabia muito sobre dieta. Tive sessões particulares com nutricionistas, tentei o Vigilantes do Peso e fiquei sabendo tudo sobre a dieta Atkins.  Eu era bom em perder peso: perdi 13,6 quilos em uma dieta com baixa gordura, mas recuperei 18 quilos. Perdi quase 23 quilos em uma dieta com baixo carboidrato, mas ganhei quase 25 quilos de volta. Perder peso era a parte fácil, manter era o desafio. Ah, e eu me exercitei muito também; eu só comia muito mais.

De volta para a faculdade de medicina. Meus colegas de sala me apoiavam muito na luta contra o peso. Ninguém nunca disse nada ruim sobre meu peso, mas o assunto surgia todo dia. Cardiologia: a obesidade está correlacionada com hipertensão e dislipidemia (eu já tinha as duas condições). Endocrinologia: aumento nos tecidos adiposos leva à resistência à insulina (minha glicemia de jejum era 6,2). Reumatologia: conforme a população aumenta, o mesmo acontece com o ônus da osteoartrite. Respirologia, nefrologia, urologia... Tirando ginecologia, tudo era motivo de preocupação.

A extensão da minha obesidade estava bem escondida: eu comprava roupas caras, sabia quais hospitais tinham roupas cirúrgicas em tamanhos extragrandes, e ainda usava o humor para rir do meu tamanho. Mas eu ainda era gordo, e isso era uma droga.

Durante meu estágio, meu preceptor cirúrgico tentou me convencer de que a cirurgia era mais promissora do que remédios: cortar é curar. Ele me disse que poderia curar o diabetes. Achei que ele estava falando sobre o transplante de células, mas ele se referia à cirurgia bariátrica. Dois meses depois, eu procurei o cirurgião e perguntei se ele poderia me avaliar em relação à cirurgia de redução de peso. Houve uma pequena espera, alguns contratempos, mas minha vez chegou. No dia 26 de maio de 2010 me graduei na faculdade de medicina. No dia 27, eu fiz uma gastrectomia vertical, um tipo de cirurgia de redução do peso restritiva.

Já faz 20 meses. Perdi quase 50 quilos e espero conseguir manter. Me sinto saudável, as pessoas dizem que estou bonito, e ainda consigo vencer meus filhos em uma corrida. Ano passado, aprendi a correr, algo que minhas articulações haviam desaprovado fortemente. Este ano, eu tenho feito até esqui, um esporte que me parecia imprudente com 145 quilos, mas que é divertido com 95 quilos.

Como meus colegas, eu conto aos meus pacientes que eles precisam se exercitar mais, comer menos, e perder alguns quilos. Mas sei que muitos irão falhar e irão continuar precisando do meu apoio e encorajamento. Alguns veem as pessoas gordas como preguiçosas: eu era ambicioso e trabalhador para manter uma posição sênior em um emprego público aos 22 anos e, depois, ser aceito na faculdade de medicina. Outros são mais caridosos e acham que os pacientes gordos são ignorantes: eu continuei gordo apesar de aprender tudo sobre a obesidade na faculdade. Eu era gordo porque eu comia muito, e meu cirurgião me ajudou a fazer algo que não conseguia por conta própria.

Alguns pacientes realmente precisam ser lembrados de que seus pesos estão aumentando, porque eles consomem mais do que gastam. Outros precisam que a gente vá além e chegue na caixa de ferramentas antiobesidade.

* "Este artigo foi publicado originalmente na versão online do periódico Canadian Medical Association Journal (CMAJ) de 10 de abril de 2012. Republicado com a permissão do CMAJ"


Entrevista

'Depois de 25 anos tentando emagrecer, concluí que era incapaz de conseguir sozinho', diz médico canadense

Há dois anos, Ben William pesava 145 quilos. Após 25 anos de tentativas frustradas de perder peso, passou por uma uma cirurgia bariátrica e agora está 50 quilos mais magro

Vivian Carrer Elias
Montagem médico
À esquerda: Ben Williams em 2010, antes da cirurgia de redução de peso, pesando 145 quilos. À direita: foto atual do canadense, 50 quilos mais magro (Arquivo Pessoal)
Desde que era criança, Ben Williams sofria com o excesso de peso. Sua história seria mais uma entre tantas, se Williams não fosse médico e se não tivesse a exposto nesta semana, no periódico da Associação Médica Canadense. Algo raro para um médico, Ben escreveu um artigo relatando sua trajetória e as dificuldades que um obeso enfrenta na tentativa de emagrecer — e permanecer assim.
Como o próprio Williams relata, toda vez que se vê tentado a aconselhar um paciente que deseja emagrecer a 'comer menos e se exercitar mais', lembra-se de que esse tipo de conselho não foi útil para ele quando enfrentava a obesidade. Seu enredo é parecido com o de muita gente: sabia tudo sobre dietas e por várias vezes conseguia emagrecer, mas não era capaz manter o novo peso por muito tempo. Ao entrar na faculdade de medicina, onde não era nada comum ser obeso, Williams teve contato com várias informações sobre os danos da obesidade ao corpo. Também foi ali que conheceu um professor que veio a ser o médico que realizou sua cirurgia de redução de peso.
Ele chegou a pesar 145 quilos quando decidiu fazer a cirurgia bariátrica, no dia 27 de maio de 2010, apenas um dia depois de sua formatura em medicina na Universidade da Columbia Britânica. Atualmente, o canadense de 33 anos pesa 95 quilos e está no segundo ano de residência de medicina de família na mesma instituição. Em entrevista ao site de VEJA, Ben Williams fala sobre como a obesidade mudou sua relação com os pacientes e as principais mudanças em sua vida após ele ter se tornado um médico com o peso ideal.
Como ter passado pela obesidade ajuda a sua relação com pacientes que sofrem com o esse problema? Uma consulta é sobre o paciente, e não sobre mim. Então, quando atendo alguém, procuro não falar sobre a minha experiência, mas me concentrar em seu caso e buscar a melhor maneira de usar a ciência a seu favor. Mas eu valorizo a minha trajetória, acredito que ela abre janelas que me ajudam a tomar certas decisões em relação ao paciente.
Quais decisões? Sei que não é tão simples dizer a uma pessoa obesa para comer menos e se exercitar mais — embora isso seja tentador — pois quando eu tinha o problema esse conselho não funcionava para mim. Esse conselho deve ser dado, mas eu busco ser o mais específico possível para aquele indivíduo, ou seja, adaptar esses conselhos para a rotina de cada um. Por exemplo, se o único exercício que um paciente faz é andar do carro até o trabalho, eu sugiro que ele estacione o mais longe que puder para que se force a caminhar. O ideal também é que uma pessoa sedentária comece aos poucos, com algumas atividades por semana, para depois intensificá-las.
Você acredita que ter entrado na faculdade de medicina foi fundamental para você ter emagrecido? Antes de entrar na universidade, eu tinha muitas informações sobre o que deveria ou não comer, sabia que precisava me exercitar e que a obesidade é ruim para a saúde, assim como eu tinha consciência de que fumar também era prejudicial. Eu fumava e consegui largar o cigarro sozinho, mas não fui capaz de deixar de ser gordo sozinho. Eu aprendi muito mais coisas nas aulas de medicina, especialmente sobre os prejuízos do problema para a saúde em relação a todo o corpo: cérebro, coração, fígado, intestino e etc. Porém, acredito que a diferença de ter entrado na universidade, e a minha sorte, foi ter encontrado um professor de cirurgia que também realizava a cirurgia bariátrica. Foi para ele que eu liguei pedindo para ser seu paciente e passar pelo procedimento, e ele aceitou.
O que te levou a tomar essa decisão? Acho que eu estava cansado de trabalhar tão duro para perder peso e depois recuperá-lo tudo de novo. Depois de 25 anos da minha vida tentando emagrecer, concluí que eu simplesmente não tinha capacidade de conseguir isso sozinho. Além disso, eu estava com medo das consequências da obesidade para a minha saúde física.
Por que é tão difícil emagrecer? Ganho e perda de peso é algo complicado e envolve genética, ambiente e comportamento. Hoje em dia as pessoas são mais sedentárias do que eram há cem anos, tanto no trabalho quanto em casa, e os alimentos calóricos estão cada vez mais acessíveis e baratos. Mas não está claro. Há uma ciência emergente sobre os fatores que envolvem a obesidade, e talvez essas respostas venham à tona e ajudem nos tratamentos. Tudo o que sei é que, quando eu fumava e antes da cirurgia, o meu desejo de ir a um restaurante e comer muito era mais forte do que a minha vontade de fumar um cigarro.
Em seu artigo, você diz que, antes de fazer a cirurgia, era bom em perder peso, mas não era capaz de mantê-lo. Quais eram as principais dificuldades em manter o peso? Eu passei pela trajetória típica de uma pessoa com sobrepeso: me empenhava em fazer dieta e atividade física, conseguia emagrecer, mas não era capaz de manter o que havia conquistado. E, depois, não só voltava aos velhos hábitos e ao meu peso antigo, mas ganhava ainda mais alguns quilos. O meu problema não era o que eu comia, e sim a quantidade. Eu gostava de comer muito e o tempo todo. Ainda assim, eu gostava de me exercitar, mas a minha saúde física não permitia que eu fizesse muitas atividades sem que eu sentisse dores. Não culpo ninguém e nem nada para o fato de eu não ter conseguido emagrecer sozinho, apenas a minha falta de capacidade de seguir em frente com uma dieta.
Seguir dietas não fez com que você alcançasse seu objetivo. Você acredita que dietas nunca funcionam para pessoas obesas? Acredito que não há evidências consistentes que indiquem que uma determinada dieta ajude pessoas obesas a perder muitos quilos, embora existam muitas pessoas que conseguiram emagrecer muito e manter o peso novo, o que é algo muito bom. Essa é a maneira mais saudável de superar a obesidade, mas eu não fui um dos indivíduos que conseguiu o resultado por esse caminho. Eu não recomendo dietas particulares, como aquelas com baixa ingestão de carboidratos ou de gordura. Para mim, o fator mais importante para tornar alguém saudável são as atividades físicas, mais do que dietas.
Você recomendaria a cirurgia bariátrica para seus pacientes? Apenas para alguns. Penso que um paciente, para passar por um processo como esse, deva ter ao menos um IMC maior do que 40 (clique aqui para calcular seu IMC). Ele deve ter esgotado todas as possibilidades e tentativas para perder peso, como dietas alimentares, prática de atividade física, participação em grupos de emagrecimento. Essa pessoa deve demonstrar-se capaz de seguir instruções de médicos e ter disciplina para comparecer às consultas após a cirurgia. O procedimento não serve para todos. Há pessoas que, mesmo obesas, estão impedidas de fazê-lo por motivos de saúde.
O que mudou na sua vida após você ter se tornado magro? Antes, eu tinha pressão e colesterol altos, quadros pré-diabéticos e era tão pesado que não conseguia me exercitar o tanto quanto gostaria pois sentia dores. Esses problemas essencialmente se resolveram. Eu passei a ter um estômago de tamanho menor, então, mesmo que eu queira, eu não consigo comer tanto quanto estava acostumado, então é mais difícil retornar ao peso que eu era antes. E pelo fato de estar mais magro, consigo me exercitar mais. Eu sempre gostei de praticar atividades físicas, mas não conseguia antes.
Além disso, eu não sou mais aquele médico gordo, mas sim sou um médico como qualquer outro. Eu era diferente, e por isso todos sabiam o meu nome no hospital. Hoje em dia, não é incomum me confundirem com outro jovem médico e, para mim, trocarem o meu nome é algo muito bom. De maneira geral, sou muito mais feliz. Me sinto mais confortável em comprar roupas em lojas comuns e consigo correr e interagir junto com meus filhos. Se eu continuasse com meu peso anterior, isso não aconteceria.
Você tem três filhos pequenos. Como sua mudança de vida influencia na educação de seus filhos? Meus filhos, de quatro, seis e sete anos, sabem que o pai deles era gordo e agora não é mais, e entendem que eu me preocupo com a alimentação da nossa família e que todos nós nos exercitemos muito. Na minha casa, estabelecemos alguns hábitos saudáveis, como comer frutas e legumes antes da refeição principal e passar o maior tempo possível em atividades ao ar livre.

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