Diante de um paciente obeso, é tentador explicar a matemática: eles
precisam comer menos e se exercitar mais. Por mais que isso seja
verdade, é quase inútil. Eu também quero que esses pacientes deixem de
lado os Venti Mochas (bebida de café altamente calórica) e coloquem suas
roupas de academia. Mas eu tento me lembrar de que esse conselho não
foi útil para mim, e dificilmente será para meus pacientes obesos.
Durante toda a minha vida, dos meus seis anos até dois anos atrás, eu
era realmente gordo. Agora não sou mais.
Quando vejo fotos antigas, percebo que algo grande aconteceu com a minha
família quando eu estava entrando na idade escolar. Nós crescemos. Bem,
as crianças cresceram verticalmente, mas a família inteira cresceu
horizontalmente. Eu mais do que todos. No ensino fundamental, eu ganhei
apelidos nada elogiosos. No ensino médio, eu estava próximo dos 136
quilos.
Depois do ensino médio, eu estudei canto, onde não era incomum ser
gordo. E eu ainda estava na extremidade mais elevada da escala. Mais
tarde, trabalhei como auxiliar de um político nos últimos dias de
governo do Partido Democrático da Columbia Britânica (British Columbia
New Democratic Party, NDP, um partido de orientação social democrata do
Canadá). Na política, aparência importa, e embora homens acima do peso
fossem uma norma, minha obesidade estava acima da média.
Em 2001, o NDP ficou reduzido a duas cadeiras na legislatura, e meu
hábito de fumar tinha aumentado para dois maços por dia. Depois que
parei de fumar, meu peso aumentou ainda mais. Quando mais tarde voltei a
estudar, indo a uma universidade comunitária à noite e trabalhando
durante o dia, nunca consegui achar tempo para ter um estilo de vida
saudável. Eventualmente, fui aceito na faculdade de medicina onde era
tudo menos normal ser gordo.
Antes mesmo da faculdade de medicina, eu já sabia muito sobre dieta.
Tive sessões particulares com nutricionistas, tentei o Vigilantes do
Peso e fiquei sabendo tudo sobre a dieta Atkins. Eu era bom em perder
peso: perdi 13,6 quilos em uma dieta com baixa gordura, mas recuperei 18
quilos. Perdi quase 23 quilos em uma dieta com baixo carboidrato, mas
ganhei quase 25 quilos de volta. Perder peso era a parte fácil, manter
era o desafio. Ah, e eu me exercitei muito também; eu só comia muito
mais.
De volta para a faculdade de medicina. Meus colegas de sala me apoiavam
muito na luta contra o peso. Ninguém nunca disse nada ruim sobre meu
peso, mas o assunto surgia todo dia. Cardiologia: a obesidade está
correlacionada com hipertensão e dislipidemia (eu já tinha as duas
condições). Endocrinologia: aumento nos tecidos adiposos leva à
resistência à insulina (minha glicemia de jejum era 6,2). Reumatologia:
conforme a população aumenta, o mesmo acontece com o ônus da
osteoartrite. Respirologia, nefrologia, urologia... Tirando ginecologia,
tudo era motivo de preocupação.
A extensão da minha obesidade estava bem escondida: eu comprava roupas
caras, sabia quais hospitais tinham roupas cirúrgicas em tamanhos
extragrandes, e ainda usava o humor para rir do meu tamanho. Mas eu
ainda era gordo, e isso era uma droga.
Durante meu estágio, meu preceptor cirúrgico tentou me convencer de que a
cirurgia era mais promissora do que remédios: cortar é curar. Ele me
disse que poderia curar o diabetes. Achei que ele estava falando sobre o
transplante de células, mas ele se referia à cirurgia bariátrica. Dois
meses depois, eu procurei o cirurgião e perguntei se ele poderia me
avaliar em relação à cirurgia de redução de peso. Houve uma pequena
espera, alguns contratempos, mas minha vez chegou. No dia 26 de maio de
2010 me graduei na faculdade de medicina. No dia 27, eu fiz uma
gastrectomia vertical, um tipo de cirurgia de redução do peso
restritiva.
Já faz 20 meses. Perdi quase 50 quilos e espero conseguir manter. Me
sinto saudável, as pessoas dizem que estou bonito, e ainda consigo
vencer meus filhos em uma corrida. Ano passado, aprendi a correr, algo
que minhas articulações haviam desaprovado fortemente. Este ano, eu
tenho feito até esqui, um esporte que me parecia imprudente com 145
quilos, mas que é divertido com 95 quilos.
Como meus colegas, eu conto aos meus pacientes que eles precisam se
exercitar mais, comer menos, e perder alguns quilos. Mas sei que muitos
irão falhar e irão continuar precisando do meu apoio e encorajamento.
Alguns veem as pessoas gordas como preguiçosas: eu era ambicioso e
trabalhador para manter uma posição sênior em um emprego público aos 22
anos e, depois, ser aceito na faculdade de medicina. Outros são mais
caridosos e acham que os pacientes gordos são ignorantes: eu continuei
gordo apesar de aprender tudo sobre a obesidade na faculdade. Eu era
gordo porque eu comia muito, e meu cirurgião me ajudou a fazer algo que
não conseguia por conta própria.
Alguns pacientes realmente precisam ser lembrados de que seus pesos
estão aumentando, porque eles consomem mais do que gastam. Outros
precisam que a gente vá além e chegue na caixa de ferramentas
antiobesidade.
* "Este artigo foi publicado originalmente na versão online do periódico
Canadian Medical Association Journal (CMAJ) de 10 de abril de 2012. Republicado com a permissão do CMAJ"
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